Brasil, nomeado logo nos primórdios de sua ocupação pelos portugueses no século XVI de “Terra de Santa Cruz”. Chegava ao “novo mundo” trazida pelos europeus uma “imagem de Nossa Senhora da Esperança”, devoção particular do comandante Pedro Álvares Cabral. Aqui começa uma história de relação, até então conhecida, entre a figura da Mãe de Jesus e o Brasil. Portanto, o nosso país foi “descoberto” sob o olhar terno e protetor também da Virgem Maria.
Passados mais de dois séculos após o episódio do descobrimento do Brasil, categoricamente vemos uma intervenção da Mãe de Deus em terras brasileiras no ano de 1717. Podemos dizer que (a vila de Guaratinguetá) “Aparecida”, entra para a história como um evento misterioso da parte do céu em busca de justiça pela causa dos menos favorecidos explorados, onde sua maior riqueza era o dom da fé. Maria passa a fazer parte da identidade do povo brasileiro. Por tanto, não se trata apenas de um acontecimento religioso, mas também, político, social e cultural, que não devemos deixar passar inadvertido nestes festejos pátrios dos 300 anos em que o Brasil celebra o encontro da Imagem de Nossa Senhora da Conceição Aparecida.
O agora tão conhecido escritor e repórter Rodrigo Alvarez pelos amantes de documentários, procurou retratar estes fatos em seu livro “Aparecida: A biografia da santa que perdeu a cabeça, ficou negra, foi roubada, cobiçada pelos políticos e conquistou o Brasil”. No capítulo vinte e sete, apresenta um dado histórico que me fez pensar e rezar sobre ele; pois, ao afirmar que a Princesa Isabel não se tornou rainha do Brasil por vários motivos de outros interesses que não eram os da monarquia, mesmo assim, não deixou o país sem uma Realeza:
Depois da oração, a coroa que a princesa Isabel dera de presente foi recolocada sobre a cabeça da santinha. Deixou de ser só um ornamento luxuoso que se juntava ao manto azul e lhe escondia a feiura do pescoço quebrado para se transformar num símbolo de poder. Era curioso. O Brasil ainda estava acostumado a viver numa República, sem nobres herdados de Portugal, mas passava a ter, tardiamente, uma rainha. Era um passo decisivo para a consolidação de uma imagem nacional que se completaria algumas décadas depois com sua proclamação como padroeira do Brasil.[i]
Pensando sobre a fecundidade do Ano da Graça que estamos experimentando com o centenário das aparições de Nossa Senhora em Fátima e o tricentenário do encontro prodigioso da Imagem da Imaculada em Aparecida, senti no coração o desejo de expressar um humilde pensamento à luz da mariologia encarnada na vida do povo, chegando a conclusão de que tanto em Fátima ou em Aparecida, nossa gente se ver na casa e na escola de Maria. Quais os fatores que me faz afirmar isto? Vejamos.
Santuário Nacional, ponto de encontro do Catolicismo brasileiro
É fato, pelo menos uma vez em cada ano, milhões de brasileiros se preparam para visitar “a casa da Mãe”. São dias de preparação, horas de viagem, para ficarem breves minutos diante da Imagem milagrosa de Nossa Senhora em Aparecida. Para o romeiro, não existe cansaço que impeça a repetição anual deste ritual para chegar ao Santuário. Incluo aqui o pensamento da Dra. Lina Boff, para nos ajudar a compreender este sentimento de pertença dos peregrinos para com o Santuário Nacional do Brasil:
Nas romarias as pessoas refletem sobre a vida e transitam no seu coração para se encontrarem a si mesmas. Fazer uma reflexão significa meditar tanto sobre as coisas mais simples como as mais complicadas da própria vida, da vida da sociedade e do mundo para buscar um sentido profundo de como viver.
A vivência da fé, do culto e da devoção a Nossa Senhora, que nos aponta Jesus, significa trazer para o tempo presente as experiências que nos deram vitalidade e também aquelas que atrapalharam a nossa caminhada de vida. Trata-se de revitalizar todas as dobras do nosso coração, dentro das quais se escondem as nossas conquistas, mas também os nossos fracassos e frustações.[ii]
“É como se estivesse em casa”, assim se sente e expressa um fiel devoto da Virgem Aparecida. Eis a grande responsabilidade dos Missionários Redentoristas! Cuidar bem do povo peregrino, pregar a sã Doutrina, insistir com os visitantes na vivência cotidiana dos sacramentos nas mais diversas comunidades católicas espalhadas em nosso imenso Brasil. Os devotos que visitam o Santuário sabem muito bem que não estão ali por mera tradição familiar, nem porque gostam de fazer turismo religioso. Se estão no Vale do Paraíba, é porque acreditam que lá a Mãe de Jesus escolheu para mostrar a sensibilidade de Deus para com o povo brasileiro.
Em todos os lugares reconhecidos pela Igreja, por causa das manifestações marianas, Aparecida ocupa um lugar especial, constituindo pouco a pouco, parte da cultura brasileira. Hoje, mesmo aqueles que não creem, sabe que o Brasil deixou cativar seu coração pela Imaculada representada na imagem quebrada encontrada no Vale do Paraíba. Ali não aconteceu uma verdadeira aparição, no sentido minucioso da palavra, mas fomos surpreendidos por uma constelação de sinais vindo dos céus e de manifestações de fé de todas as classes sociais nestes trezentos anos. Diante do fenômeno de Aparecida, acorreram escravos, portugueses, índios, ricos, pobres, gente do Sul e do Norte, do Leste e do Oeste do Brasil e do mundo.
Utilizando o termo técnico da mariologia para se falar do Brasil, não temos dúvida de que em Aparecida aconteceu uma mariofania (manifestação da intervenção da Virgem Maria no meio do povo). Em outras palavras, houve uma ação sobrenatural, desconhecida e inexplicável cientificamente nos comprovados “milagres” reconhecidos pela Igreja que ganhou um significado espiritual: “A Virgem Maria libertou o escravo, curou a cega, fez parar o cavalo na entrada da capela, apagou e fez acender as velas sobre o “altar da santa” e fez aparecer os peixes para alimentar miraculosamente, inclusive, os exploradores dos pobres da Vila. Se em Caná da Galiléia a Mãe de Jesus disse: “Eles não têm mais vinho”, em Aparecida ela disse: “Eles não têm mais peixe”. Conforme Messori, dizemos:
Em Jesus, a fé vê Deus quem vem até o homem. Em Maria, descobre a criatura humana que é elevada até Deus. A humildade do Criador e a dignidade da criatura. É a dinâmica do “duplo movimento” (alto e baixo) sobre o qual se constrói todo o cristianismo. Da síntese dessas duas realidades nasce a fé autêntica.[iii]
No Brasil a Virgem é representada de mãos postas no séc. XVIII, na França “passa as contas do rosário nos dedos de suas santas mãos” no séc. XIX, em Portugal ela convida os santos pastorinhos de Fátima a “rezar e oferecer sacrifícios pela conversão dos pecadores” no séc. XX.
À luz desta afirmação, podemos ter a certeza de que no Brasil, a Virgem Maria fez brilhar a glória de Deus por meio de sua intercessão. A Igreja, reconhecendo os feitos realizados pela Mãe do Senhor aqui nestas terras, repete com todas as gerações a saudação de Isabel: “Tu és bendita mais do que todas as mulheres; bendito é também o fruto do teu ventre (cf. Lc 1, 42). Para os brasileiros, cada Ave Maria deve ser uma profissão de fé na maternidade divina.
No Brasil a Virgem é representada de mãos postas no séc. XVIII, na França “passa as contas do rosário nos dedos de suas santas mãos” no séc. XIX, em Portugal ela convida os santos pastorinhos de Fátima a “rezar e oferecer sacrifícios pela conversão dos pecadores” no séc. XX. Sendo assim, os mistérios que contemplamos em cada dezena mostram a união entre Jesus e Maria, manifestam e lembram novamente a cooperação de Mãe de Jesus na obra da Redenção, realçando o direito que ela tem à nossa particular veneração. O próprio Filho benditíssimo de Deus não quis entregar a sua vida em sacrifício, sem a presença daquela que lhe deu a existência humana, indicando assim o papel importante de Maria Santíssima no Mistério da Reconciliação do mundo. Repito, em Aparecida, Nossa Senhora de mãos postas em prece, obriga a todos nós a reconhecer sua grandeza diante de Deus e sua maternidade no meio de nós.
Cônego José Wilson Fabrício da Silva, crl
Membro da Academia Marial de Aparecida
[i] ALVAREZ, Rodrigo. Aparecida: A biografia da santa que perdeu a cabeça, ficou negra, foi roubada, cobiçada pelos políticos e conquistou o Brasil. São Paulo: Globo Livros, 2014, p. 182.
[ii] BOFF, Lina. Aparecida: 300 anos de romaria e prece. São Paulo: Paulinas, 2017, pp. 11-12.
[iii] MESSORI, Vittorio. Hipóteses sobre Maria: Fatos, indícios, enigmas. Aparecida: Santuário, 2014, p. 184.
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