Corria o ano de 1858 e naquele recanto frio da França, chamado Lourdes, já perto da fronteira com a Espanha, viviam mais ou menos quatro mil habitantes. Ali se estabelecera a família dos Soubirous. Tiveram nove filhos e os criaram a duras penas, chegando a passar fome mais de uma vez. A primogênita era Bernard-Marie, apelidada como “Bernadette”, doente e muito frágil, teve asma desde seus primeiros anos, trabalhou como pastora e como doméstica. Naquele ano de 1858 contava então 14 anos e tinha um ardente desejo: fazer a Primeira Eucaristia. Não era grande, tinha pouco mais de um metro e meio, não se destacava por sua inteligência, tanto que não havia feito a Primeira Eucaristia porque não havia conseguido decorar o catecismo; aliás, até a oração do Credo será uma dificuldade para ela. Era analfabeta e só viria a aprender a ler e escrever já adulta. Em partes, essa dificuldade se devia ao fato de que em Lourdes, especialmente a população mais simples não falava francês, mas sim o dialeto bigourdan, e a catequese era dada e deveria ser decorada em francês... O sonho de encontrar-se com Jesus parecia distante.
Tudo mudou no dia 11 de fevereiro, quando Bernadette saiu para apanhar lenha perto da gruta de Massabielle e ouviu rajadas de vento, mas intrigou-se com o fato de que as árvores não se mexiam. Num relance quase despercebido avistou na cavidade da rocha uma luz suavíssima na qual identificou “uma Senhora vestida de branco, com uma cinta azul, um rosário numa das mãos e uma rosa amarela, como o rosário, sobre cada um de seus pés”.
Por dezoito vezes essa aparição se repetiria. As autoridades da Igreja, céticas diante disso sugeriram à menina que perguntasse o nome desta Senhora. Numa das aparições, Bernadette levou papel e um tinteiro com uma pena e ofereceu o material à Senhora para que esta dissesse seu nome, mas a jovem Senhora sorriu achando graça na inocência de sua vidente. No dia 25 de março, festa da Anunciação do Senhor, Ela dirá quem é e isto no dialeto de Bernadette: “Que soy era Immaculada Coucepciou!” A menina não entendeu nada, mas para não perder nem esquecer nenhuma palavra dirigiu-se à casa paroquial de Lourdes repetindo a frase que ouvira. Ao abrir a porta já despejou sobre o padre o que ouvira. Espanto! O padre admirou-se do que ouvia e perguntou à menina se sabia o que tinha dito, mas Bernadette não tinha ideia do que fosse o privilégio da Imaculada Conceição, proclamada como dogma de fé pelo Beato Pio IX quatro anos antes.
A Igreja reconheceu como autênticas as aparições, mas ainda restava uma dúvida ao bispo de Tarbes: “Por que Bernadette e não outra?”. Em sua cândida sinceridade a jovem justificou: “Fui escolhida porque sou a mais ignorante das moças de Lourdes e o mais fraco instrumento para transmitir qualquer coisa. Se Nossa Senhora encontrasse alguém mais ignorante que eu, certamente esta pessoa e não eu seria a escolhida”. Certamente aos que ouviram estas palavras se recordaram do que disse Jesus ao Pai: “(...) escondestes estas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos pequeninos” (Mt 11, 25).
Luiz Raphael Tonon é professor de História e Filosofia, gestor do Núcleo de Teologia do IFE Campinas e leigo consagrado da Comunidade Católica Pantokrator (raphaeltonon@ife.org.br).
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