Na Bíblia Sagrada, encontramos páginas, textos ou pensamentos que se tornaram famosos ou populares em todo o mundo, não somente no âmbito religioso, mas em citações de pensadores, nas nossas conversas informais etc. Por exemplo, quantas vezes não são repetidas, aqui e acolá, frases como: Não julgueis e não sereis julgados... A boca fala do que o coração está cheio... A verdade vos libertará..., e algumas delas são extraídas do livro dos Salmos, tais como: O Senhor é o meu pastor, nada me faltará... Vinde, ó Deus, em meu auxílio... Para o Cristianismo, os Evangelhos (Mt, Mc, Lc, Jo) constituem o coração de toda a Sagrada Escritura, pois neles se dá o testemunho de Jesus como Cristo e Filho de Deus, Salvador e Senhor. Paralelamente, para a vida cristã em geral (teologia, espiritualidade, liturgia, ética etc.), revestem-se de singular importância os Salmos do Antigo Testamento, que há séculos têm sido uma particular fonte de inspiração para os fiéis cristãos em geral. Não é em vão São Basílio Magno, Doutor da Igreja, ensinar que o livro dos Salmos “é um depósito geral dos mais excelentes ensinamentos” (Homilia ao Salmo 1). Na língua hebraica, o livro dos Salmos se chama “Livro dos Louvores” ou “Hinos” (hebr. Tehillim, da raiz hll, “louvar”). Embora somente na 3ª parte do saltério predominem os salmos de louvor (e o nome “hino” seja dado apenas ao Sl 145), esta atitude orante se faz presente ao longo de todo o livro – por isso o fiel não se esquece de louvar a Deus mesmo quando suplica (cf. Sl 22,2.26; 106,1.47s). Os termos “Salmos” e “saltério” provêm do grego “Psálmoi” (“melodias”) e “Psaltérion” (“instrumento de cordas”, como a lira, a harpa...) (1), pois, em sua maioria, eram acompanhados pelo canto instrumental. Em Lc 20,42 Jesus usou a expressão “Livro dos Salmos”. Vale lembrar que o gênero salmódico se encontra presente também em outros livros (cf. Êx 15; Nm 21,17s; Jz 5; 1Sm 21; 2Sm 1; Jó 2 etc.)
Oficialmente, a Bíblia conserva 150 salmos (2) – a numeração varia: do Sl 10 ao 148, a versão hebraica está uma unidade à frente da versão grega e latina. O livro se divide em 5 coleções (Sl 1-41; 42- 72; 73-89; 90-106; 107-150) (3), cada uma com características próprias (de estilo e conteúdo) e com uma doxologia (fórmula de louvor) conclusiva: “Seja bendito Javé, o Deus de Israel, desde agora e para sempre! Amém! Amém!” (Sl 41,14; cf. 72,18-20; 89,52s; 106,48; 150,6). É difícil determinar quando cada Salmo em particular foi composto (sua redação original e final), mas, levando em conta todas as sérias pesquisas bíblicas até o momento, é válido concluir que “os salmos foram compostos ao longo de um período de mais de setecentos anos” (4), ou seja, desde a época do rei Davi (1.000 a.C.) (5), “o cantor dos salmos de Israel” (2Sm 23,1), passando pela reforma pós-exílica de Esdras-Neemias (433 a.C.), recebendo sua forma definitiva após 300 d.C. (versão grega dos “Setenta”). Seja como for, “o fio condutor que une essas orações tão diferentes é ajudar o povo a viver a Aliança, observando a Lei e os mandamentos, celebrando a certeza da presença de Deus no meio do povo” (6), ou, em outras palavras, “ter confiança” em Deus, em sua “providência” (7).
Os vários tipos de Salmos
Não há unanimidade a respeito da classificação dos Salmos. Admite-se, em geral, que se enquadram numa subespécie do gênero literário lírico ou poético, e, dentre as diversas válidas tentativas de classificá-los, creio que podem ser divididos em 10 gêneros. (8):
1º- Oração – O ser humano fala com Deus => 44 salmos oracionais: Sl 3, 5, 6, 12, 13, 16, 17, 20, 22, 25, 26, 31, 35, 38, 44, 51, 56, 57, 59, 61, 63, 67, 69, 70, 71, 72, 74, 79, 80, 83, 84, 86, 88, 90, 102, 109, 119, 123, 126, 131, 139, 140, 142, 143.
2º - Hino – O ser humano louva a Deus => 5 salmos hínicos: Sl 8, 30, 65, 104, 145.
3º - Cântico – O ser humano fala para si mesmo, ou falar com outros celebrando algo => 36 salmos cânticos: Sl 2, 18, 29, 33, 45, 47, 48, 66, 76, 87, 92, 96, 97, 98, 99, 100, 101, 103, 107, 111, 113, 114, 116, 117, 122, 124, 129, 135, 136, 137, 138, 146, 147, 148, 149, 150.
4 º - Meditação – O ser humano fala a si ou a outros sobre vários temas => 11 salmos meditativos: Sl 1, 10, 11, 14 (=53), 46, 62, 112, 120, 127, 133. Sobre o sentido antigo de meditar, ver o Sl 77,2-13.
5 º - Exortação – A pessoa fala a outros para os encorajar => 3 salmos exortativos: Sl 37, 49, 78.
6 º - Repreensão – O ser humano quer corrigir os outros => 2 salmos admoestativos: Sl 52, 58.
7 º – Alocução – Usa-se a 2ª pessoa => 1 salmo: Sl 128. É comum nos escritos sapienciais (cf. Prov 19,18-20; 25,16ss), mas também se leem nos profetas (cf. Is 12,1-5; Jr 31,10-14).
8 º – Dialogismo – Falar alternado com outros => 5 salmos: Sl 15, 24, 118, 121, 134.
9 º – Oráculo – Deus fala ao homem => 3 salmos: Sl 50, 82, 110.
10 º – Composição – Fruto da mescla de 2 ou mais gêneros anteriores => 39 salmos: Sl 4, 7, 9-10, 19, 21, 23, 27, 28, 32, 34, 36, 39, 40, 41, 42-43, 55, 60, 64, 68, 73, 75, 77, 81, 85, 89, 91, 92, 94, 95, 105, 106, 115, 125, 130, 132, 141, 144. Pode-se incluir aqui o Sl 108.
Há outros modos de classificar os Salmos. A Bíblia de Jerusalém (edição francesa, 1998) propõe a seguinte: Hinos (Sl 8 etc.); Súplicas coletivas (Sl 12 etc.); Súplicas individuais (Sl 3 etc.); Lamentações (Sl 22 etc.); Ação de graças (Sl 18 etc.); Oráculos (Sl 2 etc.); Salmos régios (Sl 24 etc.); gêneros mistos (Sl 27 etc.). Há outras tipificações que incluem, por exemplo: Salmos de penitência (Sl 32 etc.); Salmos imprecatórios (Sl 58 etc.); Salmos didáticos (Sl 62 etc.) (9).Leia MaisA espiritualidade sálmica
Notas e complementações:
1 - Há também Salmos que são indicados para flauta, oboé (instrumento de sopro): Sl 5, 9, 10, 46.
2 - Sabe qual é o livro mais longo da Bíblia? Os Salmos possuem 150 capítulos... Mas Jeremias possui 22.285 palavras no hebraico (mais que os Salmos – 19.662). No NT, Lucas é o maior: 19.482 palavras em grego. Os Salmos foram encontrados nas grutas de Qumran (Israel, 1946-7) entre os manuscritos datados de 150 a.C.-70 d.C.
3 - S. Gregório de Nissa o descobriu. Outra divisão, levando em conta as possíveis coleções originais: 2 grupos davídicos (Sl 3-41 e 51-72); o saltério de Asaf (Sl 50 e 73-83); o dos filhos de Coré (Sl 42-49; 84-85; 87-88); o das subidas (Sl 120-134); o do Hallel (Sl 105-107; 111-118; 135-136; 146-150); além da coexistência de várias coleções.
4 - LACK, Rémi, Salmos, in DE FIORES, Stefano – GOFFI, Tullo (dir.), Dicionário de espiritualidade, S. Paulo: Paulus, 20053 , p. 1030. Isso exclui os Salmos apócrifos 151-154, de datação bem posterior.
5 - A versão hebraica atribui 73 salmos a Davi, e a grega, 82, mas por vezes se trata apenas do conteúdo. Sem dúvida há no saltério peças que têm Davi como autor, mas nem sempre a teologia bíblica consegue determinar quando há uma relação real (p. ex., o Sl 18 reproduz, de fato, um poema davídico segundo 2Sm 22; etc.).
6 - OROFINO, Francisco, Salmos: Introdução, in Bíblia Pastoral, S. Paulo: Paulus, 2017, p. 658.
7 - Em hebr. batah – cf. Sl 25,2; 55,24 etc. (BEAUCHAMP, Paul, Oração, in Vocabulário de Teologia Bíblica, dir. Xavier Léon-Dufour, 6ª ed., Petrópolis: Vozes, 1999, col. 680).
8 - La Sagrada Escritura. Texto y comentario. Antiguo Testamento. IV. Los Salmos y los Libros salomónicos, R. Arconada et alii (col.), Madrid: B.A.C., 1969, p. 12-14.
9 - Existem indicações literárias fornecidas em hebraico que também ajudam a identificar os diversos tipos de salmos: Mizmôr – ou Salmo, i.e., cântico acompanhado por instrumento de corda (57 salmos); Shir – Cântico (aparece sozinha apenas no Sl 45 e unida a Mizmôr em 13 salmos); Tefillâh – Oração (5 salmos – Sl 17, 86, 90, 102 e 142); Tehillâh – Louvor (Sl 145); Maskîl – Didático (convém a 2 salmos dos 13 a que se aplica); Miktâm – palavra de sentido incerto, talvez poema (6 salmos); Shiggâyôn – também de sentido incerto, talvez lamento penitencial (Sl).
Pe. Jonas Eduardo Gomes da Costa e Silva
Associado da Academia Marial de Aparecida.
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