História de Lourdes

Assisti no dia 11 passado pela televisão um filme antigo sobre a história de Bernadete e da Virgem de Lourdes e lembrei de imediato de meu primeiro contacto com o assunto. Deu-se na minha infância. Exatamente quando Manaus fazia-nos companhia porque também era infante. Assim como nós. Daquela geração Manaus-família dos anos sessenta. Os padres redentoristas do Bairro de Aparecida mantinham o colégio (do nível fundamental até o médio) denominado Nossa Senhora Aparecida ao lado da igreja de mesmo nome. Os professores da escola naquele ano, arregimentaram os alunos para a encenação de peça teatral sobre N. Senhora de Lourdes. Recordo de uma Bernadete adolescente e inquieta trazendo as mensagens da Senhora da gruta de Massabielle (na cidade de Lourdes-França) onde fazia suas aparições. Lembro bem de meu primo personificando o padre incrédulo e de seu amigo na pele de um robusto juiz de toga e tudo o mais. Em meu primo feito padre, puseram-lhe giz nos cabelos a fim de aparentar um senhor grisalho envergando uma batina daquelas negras, envolvido pela respeitabilidade de que o cargo impunha.

Fez tanto sucesso a apresentação da peça no auditório do colégio que se estendeu à apreciação não só de pais, alunos, mestres e funcionários, mas também à população de Manaus em única exibição em nosso Teatro Amazonas. A gruta, a Virgem, a fonte milagrosa surgiam no “gran-finale” com direito a sonoplastia, focos de luz, a angelitude, proporcionando ao ambiente a aparência etérea e mística. E a mensagem definitiva de “Eu sou a Imaculada Conceição” dada a uma Bernadete confusa que insciente do significado das palavras ficou decepcionada, pois pensou não tratar-se da Virgem Maria. Somente o pároco entendeu os dizeres posto que anos antes havia sido definido o dogma da Imaculada Conceição de Maria (concebida sem pecado) pelo papa Pio IX. Até os dias contemporâneos é enorme a peregrinação até o santuário em Lourdes (lá foi erguido a pedido da Virgem) e o dia comemorativo da Santa ficou estipulado como o dia onze de fevereiro, o mesmo dia dedicado aos enfermos. Existe, pois uma estreita ligação entre a Virgem e os enfermos, visto ser famosa a fonte que ela própria indicou por seus fins miraculosos. Ali existe durante o ano inteiro a procissão dos doentes. Centenas de pessoas são levadas pelos familiares ou voluntários em cadeira de rodas e pedem a cura de seus males físicos. São comprovadas pela ciência numerosas curas. Outras pessoas se não curadas sentem ali a renovação interior de sua fé, fortalecida em esperança; outros sentem a cura do íntimo de enfermidades espirituais. Até chefes de Estado lá estiveram a fim de implorar paz para seus países e para o mundo.

O significado dessas Aparições de Maria ao longo dos anos sempre escolhendo “o que há de mais débil no mundo” (Cor. 1, 27) no caso de Lourdes a menina Bernadete Soubirous de pobreza material maxima. Mas essa é a diaconia mariana! É custódia fiel, de doação e amor como “Mãe da Humanidade”. Maria é a ENVIADA. A própria Bernadete fez uma oração a Virgem: “Sim, mãe querida, tú baixaste até a Terra e apareceste a humílima menina... Tú rainha do céu e da terra quiseste escolher-me porque era o que de mais frágil havia no mundo” (“Diário dedicado à Rainha do Céu”- 1866). Aquela apresentação do texto teatral singelo, mas de muito êxito à época em Manaus, deixou a todos conscientes do acontecido sobrenatual. Principalmente a nós crianças-da-Manaus-criança. Ainda sem mazelas e malícias. Sem lutos, sombras e destroços. Luto da violência. Sombra do individualismo. Destroços dos valores espirituais. Valores que eram tão nossos! E a nós, enfermos sociais no agora, exibo essa reminiscência pueril, mas com o poder de resgate através da fé e esperança da Manaus companheira. Mesmo com dois milhões de habitantes. Ela pode ser imensamente humana. Basta querer. E tudo virá por acréscimo...

Carmen Novoa Silva é membro da Academia Amazonense de Letras e da Academia Marial