Por Leonardo C. de Almeida Em Palavra do Associado Atualizada em 25 JAN 2019 - 09H09

Nossa Senhora e a Cidade

Por que a Virgem da Penha é a Padroeira de São Paulo?

Leonardo C. Almeida
Leonardo C. Almeida
Vitrais Igreja Nossa Senhora da Penha


Em 25 de janeiro, Festa Litúrgica da Conversão de São Paulo, comemora-se também o 465º aniversário da capital paulista. Uma missa celebrada no dia da conversão do "Apóstolo dos Gentios", em 1554, marcou o início de um aldeamento jesuítico liderado pelo Padre Manoel da Nóbrega, Irmão José de Anchieta, dentre outros. Em torno da Capela do Senhor Bom Jesus e do Colégio, fundados pelos jesuítas no Planalto de Piratininga, desenvolveu-se a Vila de São Paulo, que se converteria, séculos mais tarde, na metrópole que hoje conhecemos, polo financeiro, de tecnologia e cultura, mas repleta de desafios e problemas socioeconômicos, ambientais e de planejamento urbano.

A partir do seu centro histórico, precisamente do triângulo formado pelas igrejas das Ordens dos Beneditinos, Franciscanos e Carmelitas, a cidade foi se expandindo para além dos rios Tamanduateí e Anhangabaú.

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No alto de uma colina a leste da Vila, distante daquele núcleo central, numa região de clima agradável e que servia como ponto de paragem de tropeiros e caminho para quem ia às Minas Gerais ou ao Rio de Janeiro, próximo ao Ribeirão Aricanduva, localizada antes da Aldeia de São Miguel do Ururaí (hoje, bairro de São Miguel Paulista), no ano de 1667,  um milagre aconteceu e correu toda a São Paulo de outrora.

Conta-se que um viajante francês, portando uma imagem de Nossa Senhora, pernoitou no alto daquele penhasco. No dia posterior, seguindo sua viagem, notou que a referida imagem não se encontrava mais entre os seus pertences. Voltando à sua procura, encontrou-a no cume da colina onde passara a noite. Guardou-a e retomou viagem. O fato misterioso, entretanto, repetiu-se. Atento à vontade do Alto, entendeu que a Mãe do Senhor, através daquela bela imagem havia escolhido o altaneiro penhasco para sua morada e local onde derramaria graças aos que a Ela acorressem. Ergueu o homem piedoso, então, uma capela para abrigar a milagrosa imagem de Nossa Senhora da Penha de França, em torno da qual se desenvolveu o bairro homônimo e a Paróquia (com o primitivo e antigo Santuário, a Igreja do Rosário dos Homens Pretos e, posteriormente, a Basílica, onde se encontra preservada a bendita imagem da Senhora). Historicamente, registra-se que o Padre Jacinto Nunes Siqueira ergueu, em 1668, “fase das sesmarias precursoras”, no alto da colina da Penha de França, uma capela para abrigar uma imagem miraculosa da Virgem da Penha.

Mas por que Nossa Senhora da Penha, cujo santuário encontra-se na Colina Santa, distante cerca de 9 km do núcleo central da cidade, tornou-se padroeira da capital paulopolitana?

A fama dos muitos milagres de Nossa Senhora da Penha atravessou São Paulo, motivando paulistanos e moradores de outros lugares a organizarem romarias imensas para a Penha de França, o “Bairro dos Milagres”, a fim de pagarem promessas e ofertarem bens preciosos à Mãe de Deus como gesto de louvor e gratidão. Isso fez com que, nos séculos XVIII e XIX, inúmeras vezes, a população e a Câmara Municipal recorressem à Virgem da Penha para sanar as secas e epidemias, sobretudo de varíola, que assolavam a cidade São Paulo de então. Os vereadores, assim, pediam autorização ao Bispo de São Paulo ou ao Cabido da Sé Catedral para que a imagem milagrosa de Nossa Senhora fosse transladada da Penha até a Catedral da Sé ou à Câmara, de onde a Mãe de Deus agia em favor da cidade, cessando milagrosamente as secas ou doenças - o que lhe rendeu o título de Padroeira da Cidade de São Paulo, por aclamação popular (mais tarde reconhecida pelo Papa São João Paulo II na Bula com a qual a nova Matriz da Paróquia da Penha foi elevada à dignidade de Basílica Menor).

No centro da cidade, a imagem era honrada com inúmeras homenagens, como missas, novenas, pregações e procissões majestosas realizadas com a presença de milhares de paulistanos vindos de todos os lugares. Esse episódio das ditosas transladações da imagem da Virgem Santíssima da Penha de França de São Paulo encontra-se perpetuado em imenso e belíssimo vitral tripartido sob o coro da Basílica, dividindo o adro e a nave principal da monumental igreja da Padroeira da Cidade.

Acredita-se, ainda, que as conhecidas Avenidas Rangel Pestana e Celso Garcia foram abertas, entre outras razões, para facilitar a transladação da imagem à antiga Sé e o afluxo dos romeiros ao Santuário da Penha, que vinham agradecer a intercessão da Padroeira da Cidade. Era, na verdade, uma forma dos devotos “retribuírem” a visita de Nossa Senhora à cidade em tempos de calamidade, visitando-a, eles mesmos, em seu Santuário, especialmente durante as vultosas festividades de setembro. A igreja do Senhor Bom Jesus de Matosinhos (hoje Paróquia do Bom Jesus do Brás), à Avenida Rangel Pestana, era local de pouso da veneranda imagem quando de suas transladações ao centro de São Paulo.

A tradição das peregrinações da imagem à Sé cessou, segundo consta, em 1876. Contudo, recentemente, em 2015, quando grave crise hídrica se abateu sobre a cidade, mais uma vez, a imagem de Nossa Senhora da Penha foi transladada à Sé. Surpreendentemente, durante a procissão que a conduziu da Igreja da Consolação à Catedral da Sé, uma chuva regou o Centro Histórico de São Paulo.

Leonardo C. Almeida
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Nossa Senhora da Penha


Por toda essa relação secular de Nossa Senhora da Penha com a Cidade da qual é Rainha e Padroeira, os seis vitrais que ladeiam o nicho em que se venera a imagem tricentenária da Virgem na Basílica retratam episódios marcantes da história e do cotidiano de São Paulo: suas origens, etnias, industrialização, progresso, arte, cultura etc. Por essa mesma razão, uma das bandeiras dispostas em frente ao nicho é a da Capital Paulista. Outros meios, como hinos, orações, poemas e documentos históricos também atestam, fazem referência ou recordam de forma laudatória a invocação da Senhora da Penha como Padroeira da Capital ora aniversariante.

A Vila de Piratininga, cresceu, mostrou sua vocação para Metrópole e tornou-se a São Paulo de tanta diversidade, riqueza cultural, vida pulsante e ritmo frenético. A nós, paulistanos e (i)migrantes que esta metrópole acolhe com os braços abertos, como “filhos” de São José de Anchieta, cabe-nos tornar esta sua “Vila”, tão marcada pela violência e por alarmantes preconceitos de várias espécies, exclusões e contrastes sociais, uma cidade justa e solidária, atenta e solícita aos que são marginalizados ou vitimados pela poluição desmedida, pelos vícios, pelas doenças e a carência de recursos para a saúde, a falta de alimento, moradia, emprego, educação...

Certamente, Anchieta, Patrono da Academia Marial de Aparecida e devotíssimo da Virgem Maria, alegra-se nos céus porque a cidade por ele fundada no Pateo do Collegio elegera como sua Padroeira a Senhora da Penha, Virgem do penhasco, do “Planalto de Piratininga”. E que as pessoas de boa vontade que residem na Capital paulista – inspiradas por Maria, motivadas pelo anseio de José de Anchieta e seguindo as pegadas de Frei Galvão, Madre Paulina, Dom Luciano Mendes de Almeida, Dom Paulo Evaristo Arns e tantas outras testemunhas da Verdade libertadora, leigos ou religiosos, que viveram em São Paulo – perseverem em favor de uma cultura de paz e justiça, afinal “Deus habita esta cidade” (Sl 47,9).

Leonardo C. de Almeida
Associado da Academia Marial de Aparecida

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