Por Pe. Márcio Fabri dos Anjos, C.Ss.R. Em Revista de Aparecida

A Fé e as dúvidas

Luca Signorelli / Wikimedia Commons
Luca Signorelli / Wikimedia Commons
Jesus e São Tomé: Se eu não vir o sinal dos pregos em suas mãos, se não puser meu dedo na marca dos pregos e se não colocar minha mão em seu peito, não acreditarei” (Jo 20,24)


A relação entre Dúvida e Fé começa com uma certeza: neste mundo é preciso duvidar. Sem a capacidade de duvidar, caímos na ingenuidade, nas enganações e notícias falsas. E mesmo que pensemos ter capacidade para entender o que vai escondido nas coisas, precisamos duvidar de nossa própria capacidade para perceber tudo. Somos limitados, e duvidar faz parte de nossa condição humana. O próprio desenvolvimento tecnológico é estimulado pela dúvida metódica e a possibilidade de sempre melhorar o conhecimento e as técnicas. Essa forma de dúvida se chama ‘cognitiva’. Outro tipo é a dúvida “moral”. Ela, no fundo, responde à questão: em quem confiar, ou mesmo no quê confiar? Aqui a dúvida é precaução, pois ao confiar, a gente está de algum modo se arriscando. Ao entrar em um veículo, p. ex., a gente está confiando que a viagem é segura. Mas é preciso dar atenção quando há sinais de que não é tão seguro. Às vezes ficamos até com medo, e sem saber o que fazer. A dúvida moral é tanto mais forte quanto mais implicar no encaminhamento de nossa vida. Somos seres inseguros e isso nos leva a duvidar. Muitos pensam que a insegurança se resolve fugindo ou revidando, mas a experiência mostra que só adia ou até aumenta o problema.

Onde entra a fé em meio às dúvidas? A fé, na prática é confiança. Crer é confiar. E a confiança tem suas fases de desenvolvimento humano desde o nascer, quando começamos a descobrir o confiar e o desconfiar. A ciência ajuda muito nesse processo, mas não dá conta de tudo. A fé cristã, muito mais do que a crença em teorias e doutrinas, é confiança em Jesus Cristo, caminho de vida e a verdade sobre quem somos. Ele vai na contramão da lógica que conhecemos: em vez de ferir ou dominar os outros, Ele dá de si, até a própria vida, para construir um ambiente de confiança. Por isso, é muito ilustrativo o relato sobre São Tomé. Em vez de ser o “apóstolo que duvidou” S. Tomé espelha a nós que não vimos Jesus. Para nós a pergunta é: como confiar em Jesus se não o vimos? Será que tudo não passa de uma invenção enganosa? A solução é “tocar” nas chagas de Jesus, não um tocar físico, mas moral. É reconhecer o Amor com que nos amou primeiro, confiar que só o Amor é um caminho seguro para o viver humano. O caso S. Tomé ensina que precisamos continuar duvidando de uma fé que não toca na realidade do quanto somos amados e não mostra gestos concretos que nos tiram do egoísmo a serviço dos outros. Isso se aprende e pratica aos poucos, pois os medos nos rodeiam. O evangelho de Mateus relata que até na despedida de Jesus deste mundo muitos discípulos “ainda duvidavam” (Mt 28,17). Aqui vamos nós. As principais dúvidas da fé não são teóricas; elas se mostram em nossa dificuldade de sair dos egoísmos e amar como Jesus amou.

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