Por João Pedro Ribeiro e Victor Hugo Barros
A Igreja Católica se prepara para celebrar, em todo o mundo, o Jubileu de 2025. A Revista de Aparecida entrevistou, com exclusividade, o pró-prefeito do Dicastério para a Evangelização e responsável pelo Jubileu 2025, Dom Rino Fisichella.
Na conversa, o representante do Vaticano explicou o sentido das comemorações, o significado do tema “Peregrinos da Esperança” e o modo de receber a indulgência jubilar.
Revista de Aparecida: Por que a escolha do tema “Peregrinos da Esperança” para o Jubileu de 2025?
Dom Rino Fisichella: É muito simples, porque a Igreja vive na história. O Jubileu acontece na história, surge ao longo da história. Aqui está o porquê neste momento particular da história o mundo pede à Igreja um sinal de esperança, uma voz de esperança. A esperança não significa esquecer o presente. Pelo contrário, significa ser capaz de olhar os acontecimentos do mundo de hoje. E o mundo de hoje, se pensamos o que foi a pandemia, se pensamos nas guerras que estamos vivendo, todas aquelas situações de violência que nos circundam e também de sofrimento que estão ao nosso redor no mundo, na nossa sociedade, na nossa comunidade... Então, peregrinos da esperança quer dizer peregrinos que estão a caminho, mas temos uma palavra de esperança para levar ao mundo, porque Jesus é a nossa esperança.
Revista de Aparecida: Na história, o Jubileu é marcado pela reconciliação, como um período de paz. Na própria bula de convocação o papa usa expressões muito fortes, como pedido de anistia e perdão de dívidas de países pobres. Como viver este Jubileu diante das guerras que acontecem no mundo e também com países cada vez mais fechados em si mesmos?
Dom Rino Fisichella: O papa, na Bula Spes non Confundit, fala de anistia, de perdão, de perdão de dívidas, é verdade. São os apelos que o papa faz, sobretudo aos governos, às grandes nações, para que se lembrem que o Jubileu desde os tempos bíblicos, coloca esta dimensão em primeiro plano. Não é outra coisa senão um sinal de justiça e um sinal de solidariedade. O papa pede que todos os crentes participem disso. Penso quando na Bula se diz que os bispos são todos solicitados no período do Jubileu a estar presente junto aos seus governos para que consigam o fim da pena de morte, que seja cancelada a pena de morte. Penso também em nós. Quantas vezes nos lembramos da dimensão profunda do perdão? Há uma bela expressão na Bula. O papa diz: ‘Sim, o perdão não cancela o passado. O passado já aconteceu e nos faz sofrer. Mas o perdão, à luz da esperança, pode nos dar a possibilidade de viver de modo diferente, viver muito melhor’.
Revista de Aparecida: A Bula “Spes non confundit” não prevê a abertura de portas santas nas Igrejas Particulares e nos Santuários, como aconteceu no Jubileu Extraordinário da Misericórdia. Recentemente o próprio Dicastério para a Nova Evangelização publicou uma carta esclarecendo que apenas as Basílicas Papais terão suas portas abertas. O que motivou essa decisão?
Dom Rino Fisichella: Agradeço a vocês por essa pergunta, porque é importante esclarecer. A Porta Santa não é o sinal principal do Jubileu. A Porta Santa no primeiro Jubileu, de 1300, não existia. A primeira vez que encontramos a Porta Santa é em 1475. Portanto, é um sinal que aparece muito tarde. Sim, é um sinal importante porque indica a passagem da nossa conversão. Mas, por tradição, a Porta Santa sempre esteve presente nas quatro basílicas papais. Sim, no Jubileu passado o papa concedeu que em todas as catedrais, em todas as basílicas, em todos os santuários pudesse haver uma Porta Santa. Mas não era uma Porta Santa. O papa a chamou de Porta da Misericórdia. Não nos esqueçamos que aquele era um Jubileu particular. Era o Jubileu da Misericórdia. O sentido daquela Porta da Misericórdia significava que está aberta para todos, não exclui ninguém. A Porta Santa, com o Jubileu ordinário de 2025 retorna, em vez disso, agora, às quatro basílicas. Quero, entretanto, especificar uma coisa: a Porta Santa é um sinal particular, a Porta Santa fica fechada por 25 anos e é sempre a mesma Porta. Que significado possui abrir uma porta qualquer nas catedrais ou nos santuários, uma porta que estamos habituados a utilizar para entrar e para sair? Não seria um sinal do Jubileu. O sinal do Jubileu permanece o da indulgência. Esta é a coisa importante. O papa diz que a indulgência é graça que nos foi dada. Eis porque devemos nos empenhar para descobrir o grande sinal de indulgência jubilar.
Revista de Aparecida: Mesmo quem não puder peregrinar até Roma vai ter a chance de ganhar as indulgências? Quem peregrina até o Santuário de Aparecida, por exemplo, poderia receber as indulgências do Jubileu?
Dom Rino Fisichella: A Porta Santa está nas quatro basílicas, mas a indulgência está aberta para todos. É suficiente que os bispos tenham em mãos o Decreto da Penitenciária Apostólica publicado no dia 13 de maio para indicar todos os lugares onde se pode viver, experimentar e obter a indulgência jubilar. Isto é, esse grande perdão que nos será concedido, o total perdão dos pecados e da nossa culpa. Uma coisa importante, que muitos bispos estão fazendo desde já, nós estamos recebendo no Dicastério estas indicações. Muitos bispos estão fazendo, de sua parte, indicando nas suas dioceses quais serão os lugares, as igrejas, os santuários onde será possível viver, experimentar e obter a indulgência jubilar.
Revista de Aparecida: Na bula, os Santuários Marianos são considerados lugares privilegiados para gerar esperança. Os peregrinos que se dirigem aos Santuários, no nosso caso, ao Santuário de Aparecida, podem aprender com a Virgem Maria a gerar essa esperança?
Dom Rino Fisichella: Os santuários são espaços privilegiados para viver o Jubileu porque são aqueles lugares onde nós vamos em peregrinação, onde podemos nós somente ser peregrinos, mas se tornar também aqueles que escutam uma palavra de esperança. Não se vai ao santuário somente para pedir. Antes de tudo devemos ser capazes de ir ao santuário para escutar, para contemplar, para entender de verdade a mensagem que nos traz. Estou particularmente feliz de poder saudar a todos os peregrinos de Aparecida. Aparecida, há mais de 300 anos, é um lugar de esperança. Não esqueçamos o nascimento de Aparecida. Aparecida nasce de uma pesca, uma pesca milagrosa. Parece até nos lembrar do Evangelho, quando Jesus diz a Pedro e aos discípulos para lançar as redes e pescar. É a mesma coisa. É o momento de graça, momento de esperança. Se vamos somente conosco, com os nossos problemas, jogamos as redes e estarão sempre vazias. Mas, se vamos com a graça, com a certeza de que a Virgem Aparecida nos escuta, então aquelas redes voltarão cheias, estarão carregadas da graça, com tudo o que desejamos realizado.
Revista de Aparecida: O Papa Francisco lembra, na bula de proclamação do Jubileu, que em 2025 os cristãos celebram a Páscoa na mesma data. Ao mesmo tempo em que fala do seu sonho de que isso aconteça não apenas por uma coincidência, mas como sinal de unidade. Como o Jubileu pode não ser apenas sinal de esperança nesta unidade, mas trabalhar efetivamente para ela?
Dom Rino Fisichella: É verdade. Em 2025, serão também 1700 anos do primeiro Concílio da história da Igreja, ou seja, o Concílio de Niceia. E nessa data, coincidentemente, os ortodoxos também celebrarão a Páscoa na mesma data que os católicos. Que ocasiões, pergunta o papa, para dizer como é importante que pelo menos o sinal que nos mantém unidos, o sinal da Páscoa, a nossa fé no Senhor ressuscitado, possa ser celebrado em todo o mundo no mesmo dia. É um começo. Esperamos que o Jubileu possa ser também um momento especial, porque, a partir daí, os cristãos de todo o mundo podem viver a Páscoa no mesmo dia. Não esqueçamos, porém, que o Concílio de Niceia é também o primeiro Concílio onde se expressa a fé em Jesus Cristo, o Filho de Deus. E isso é feito de uma maneira particular. Ele disse a si mesmo: "nós cremos". Aqui, no Jubileu da Esperança, não dizemos apenas: “nós cremos”. Mas devemos acrescentar: "Nós esperamos". A esperança não pertence a um indivíduo. O primeiro que ele espera é a Igreja. Portanto, a primeira esperança que nos é dada é através da Igreja, a proclamação do Evangelho da Esperança que nos é dado. Vamos aprender a dizer "nós esperamos". Num período como o nosso, de forte individualismo, recuperem esta dimensão profundamente comunitária. Acho que é fundamental para todos nós.
Revista de Aparecida: Em meio às tribulações da realidade de todo o ser humano, o papa ressalta a paciência como modo de reafirmar a firmeza, e a firmeza para reafirmar a esperança. Em um mundo imediatista, como os cristãos podem fortalecer a paciência e, dessa maneira, levar a esperança para o mundo?
Dom Rino Fisichella: É verdade, o papa fala de paciência. É interessante, porque quando falamos, São Paulo fala sobretudo de esperança, diz que estamos impacientes para poder alcançar a salvação. É por isso que também nós somos chamados neste momento a fazer nossa uma palavra que desapareceu do nosso vocabulário. Paciência. Em um período e em uma cultura como a nossa, a cultura da internet – claro, é muito bonita, nos permite poder nos comunicar à distância – mas também nos coloca com muita pressa. Queremos tudo imediatamente. Não podemos esperar, não podemos esperar. O papa nos mostra como a paciência é uma virtude de que os cristãos precisam. Não apenas para expressar a verdade da esperança. A esperança exige um caminho, requer a paciência da espera do cumprimento entre o que já estamos esperando e o que será o cumprimento final. Mas sem paciência não seremos verdadeiros crentes. Mas atenção: quando dizemos a paciência de Jó, devemos também entender o que significa. Jó não é um paciente passivo, pelo contrário. Jó é paciente. Mas ele é forte em sua paciência. É ele quem se rebela diante das situações em que ele é posto à prova. E é também aquele que, com a sua paciência, chama Deus a julgamento e pergunta-lhe agora: “Quero falar convosco. Quero que me digas por que me pusestes à prova e porque eu vivo todo esse sofrimento". Portanto, não vamos entender mal o senso de paciência. A paciência é uma dimensão ativa, mas a dimensão dinâmica. É algo que exige de nós muita atenção e grande paixão com um grande entusiasmo de vida.
Revista de Aparecida: Como as ações do Jubileu da Esperança se encontram com as ações do Sínodo da Sinodalidade?
Dom Rino Fisichella: Em outubro, seremos convocados novamente para a segunda e última sessão do Sínodo. Mas o jubileu é vivido em uma dimensão sinodal. As peregrinações que se fazem não são mais do que uma peregrinação daquilo que é a Igreja, daquilo que é a comunidade cristã. É uma comunidade de pastores com seu próprio bispo, sacerdotes, pessoas consagradas, o povo de Deus. Todos juntos para caminhar, todos juntos para indicar que temos uma tarefa comum, aquela que nos vem do nosso batismo. O Batismo nos torna todos responsáveis por sermos anunciadores fiéis, mas também entusiastas do Evangelho. Este é o Sínodo, o Sínodo põe diante de si, em primeiro lugar, a necessidade da evangelização. Como a Igreja redescobre que é uma comunidade onde os dons, os carismas de cada um se tornam para cada um de nós um instrumento para anunciar o Evangelho da salvação ao mundo de hoje.
Revista de Aparecida: No Jubileu da Misericórdia o papa promoveu também audiências aos sábados. Desta vez, porém, a saúde do papa é mais frágil. Há alguma expectativa de adição de eventos ao calendário do Santo Padre?
Dom Rino Fisichella: Eu falei com o papa de todos os grandes eventos que acontecerão durante o Jubileu, cerca de 35 grandes eventos nos quais o papa está sempre presente. Então haverá a vida diária. Mas, felizmente para nós, o papa é forte. O papa, de fato, confidenciou-me. Tudo o que há para fazer, estarei presente. Por isso, rezemos pela sua saúde, mas sabemos também que, apesar da fragilidade da idade, tem força e entusiasmo para viver e exprimir plenamente o valor do Jubileu.
Revista de Aparecida: Sabemos que Roma se prepara para acolher 32 milhões de peregrinos. Há a expectativa de que quantos destes sejam brasileiros?
Dom Rino Fisichella: Posso dizer que haverá 32 milhões de peregrinos e entre eles haverá centenas, incluindo cristãos, católicos que virão do Brasil. O que eu peço para vocês é que eu espero todos vocês. Deixem-nos saber. Vocês têm nosso aplicativo. Posso dizer que pelas solicitações que vemos nas pesquisas que fazemos, depois da Itália, o Brasil é o primeiro país que intervém em nosso site que possui o aplicativo do Jubileu, que acessa nosso portal para ver todas as informações que nos são dadas. Eu realmente agradeço por esse interesse do fundo do meu coração. Espero ver vocês em Roma, especialmente para o jubileu dos jovens, no final de julho. Que este seja um momento especial para todos nós vivermos juntos a experiência do Jubileu, que é uma experiência de grande esperança. Uma experiência por meio da qual queremos não só ser portadores de esperança, mas podemos ser na medida em que, unidos a Cristo, como diz o Apóstolo, Cristo é esperança em nós, somos também capazes de a viver, transmitir e partilhar com tantas pessoas que hoje dela têm profunda necessidade. Agradeço-vos, saúdo-vos e peço que em Aparecida haja uma oração pelo Jubileu e também por todos nós, em primeiro lugar pelo Santo Padre Francisco, e depois por todos nós que estamos a trabalhar no Jubileu, para que haja uma oração de apoio, a sua recordação e a sua amizade. Tchau. Muito obrigado!
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