Por Valquíria Vieira Em Igreja

"O Brasil precisa pensar numa política de cuidado para atender pessoas idosas"

idoso_aposentadoA Pastoral da Pessoa Idosa (PPI), organismo ligado a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) conhece de perto a realidade dos idosos brasileiros.

Nesse ano de 2014, a Pastoral da Pessoa Idosa está completando 10 anos de atuação buscando assegurar a dignidade e a valorização integral das pessoas idosas, através da promoção humana e espiritual, respeitando seus direitos, num processo educativo de formação continuada destas, de suas famílias e de suas comunidades, para que as famílias e as comunidades possam conviver respeitosamente com as pessoas idosas, protagonistas de sua autorrealização. 

A coordenadora nacional da Pastoral da Pessoa Idosa, irmã Terezinha Tortelli, em entrevista ao A12.com falou sobre as realidades constatadas nesses 10 anos de trabalho, a valorização dos idosos a partir da mensagem do Papa Francisco e as política públicas para essa faixa etária.

 

"A resposta pode parecer cruel, mas infelizmente é a realidade. Como vem lembrando com muita frequência o Papa Francisco: estamos vivendo uma época de descarte das pessoas que não produzem".

A12 - Nesses 10 anos de trabalho da PPI, o que a senhora observa de mudança na vida do idoso brasileiro?

Ir. Terezinha - A missão da Pastoral da Pessoa Idosa é ir ao encontro das pessoas idosas mais vulnerabilizadas, seja pela pobreza, pelo isolamento, pela solidão ou por outras fragilidades físicas ou sócio-assistenciais. Nestes 10 anos de acompanhamento a essas pessoas, temos presenciado um aumento impressionante de novas pessoas nestas condições.

Me explico: pelo fato dos voluntários da PPI – nossos Líderes comunitários, que são os que fazem as visitas domiciliares de forma regular e permanente, vão descobrindo cada vez mais pessoas que têm necessidade desse trabalho de ir ao encontro, de visitar, de dar atenção, de conhecer a realidade, de ser de alguma forma, porta-voz, um elo entre essas pessoas e os serviços de apoio; milhares de pessoas idosas vivem muitas vezes em condições tão precárias e são situações desconhecidas do poder público.

A resposta pode parecer cruel, mas infelizmente é a realidade. Como vem lembrando com muita frequência o Papa Francisco: estamos vivendo uma época de descarte das pessoas que não produzem.

Temos muita esperança de ver acontecer mudança. Por enquanto, a PPI tem sido uma voz profética, mostrando a existência de um grande contingente de pessoas idosas que, infelizmente, vivem em situações bem precárias em nosso país.

A12 - No dia 28 de setembro o Papa se encontrou com milhares de vovôs e vovós de todo o mundo. Como a PPI participou desse momento?

Ir. Terezinha - Primeiramente, divulgando esse evento já que para nós todos, voluntários da PPI, foi uma grande alegria saber dessa jornada que o Papa Francisco dedicaria às pessoas idosas, com o tema: “A bênção de uma vida longa”. Dessa maneira, todos os nossos voluntários aguardavam esse dia para ver e ouvir a mensagem do Papa para as pessoas idosas.

A Pastoral da Pessoa Idosa teve a graça de participar dessa jornada, na Praça de São Pedro em Roma, estivemos lá, eu e a Irmã Ketty Folly da equipe nacional da PPI. Tivemos também a oportunidade de estar na Rádio Vaticano, e apresentar o trabalho dedicado às pessoas idosas, através de milhares de voluntários, aqui no Brasil.

Ainda em função dos 10 anos da PPI e dessa jornada que o Papa Francisco dedicaria às pessoas idosas, o Presidente da PPI, Dom José Antonio Peruzzo, escreveu uma carta ao Papa Francisco apresentando o trabalho da Pastoral da Pessoa Idosa a Sua Santidade.

 

(...) já somos 24 milhões de pessoas com 60 ou mais anos de idade no Brasil. E os serviços de apoio não evoluíram.

A12 - Sobre as políticas públicas voltadas para a pessoa idosa, o que a PPI acredita ainda estar faltando?

Ir. Terezinha - O que temos de muito bom no Brasil, na área da pessoa idosa, é uma legislação bem feita, que garante direitos, que assegura saúde e proteção a todas as pessoas idosas. Como exemplo, podemos citar a Política Nacional do Idoso (1994) e o Estatuto do Idoso (2003). Contudo, infelizmente, nos resta constatar que, por falta de implementação dessa legislação, quase tudo ainda nos falta nessa área. E acredito que aqui está a justificativa à resposta da primeira pergunta.

Para avançar nas políticas públicas voltadas para as pessoas idosas, terá que ser feito um longo caminho de criar outros modelos de serviços públicos ou privados, capazes de atender à demanda crescente nesta área. Apenas para citar algum: a criação de Centros Dia – locais onde os familiares pudessem deixar em segurança seus idosos e aí passar o dia, conviver com outras pessoas, receber todos os cuidados necessários. Esse é um serviço extremamente necessário num contexto de mudança acentuada do perfil demográfico e serviria de suporte para as famílias que têm dificuldade de conseguir alguém para companhia ou para atender às necessidades da pessoa idosa em casa enquanto os adultos saem para trabalhar.

A12 - A partir do trabalho pastoral, é possível nos relatar como está a realidade do idoso na atualidade? 

Ir. Terezinha - Tenho insistido em dizer que a visão sobre essa faixa etária está equivocada. Há um grande interesse em divulgar programas na área do envelhecimento, do tipo: pacotes de viagem, turismo, esporte, lazer. Tudo isso é muito importante, mas percebe-se um grande interesse econômico, além de que apenas uma parcela das pessoas idosas pode usufruir dessas benesses; há um descompasso com a realidade da maioria: por um lado, grande investimento para alguns (os que estão bem de saúde, tem condições financeiras) e por outro lado pouquíssimo recurso destinado para atender à demanda dos pobres, dos frágeis, dos desamparados. E estes precisam de SERVIÇOS para atender às suas necessidades.

Hoje já somos mais de 24 milhões de pessoas com 60 ou mais anos de idade no Brasil. E os serviços de apoio não evoluíram, temos os mesmos que tínhamos há cem anos, os conhecidos asilos.

O Brasil precisa pensar seriamente numa política do CUIDADO para atender à demanda das pessoas idosas frágeis.

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