Brasil

A Marcha das Eleições: O Direito ao Voto no Brasil

Padre Inácio Medeiros C.Ss.R.

Escrito por Pe. José Inácio de Medeiros, C.Ss.R.

09 MAI 2022 - 09H24 (Atualizada em 09 MAI 2022 - 09H52)

Estamos nos preparando mais uma vez para as eleições majoritárias em outubro desse ano, ocasião propícia para um processo de educação política. Apesar do voto ser um exercício de democracia universal, bem sabemos que no Brasil nem sempre foi assim e nem todos a ele tinham acesso.

Desafios pertinentes como “voto de cabresto” e “coronelismo” continuam acontecendo em formas modernizadas que se utilizam inclusive das redes sociais para manipular e domesticar os eleitores, gerando, como no passado, dependência e submissão.

O processo eleitoral no Brasil Colônia

Uma das características do processo eleitoral no Brasil Colônia era a limitação ao exercício do voto, com a exclusão da maioria da população, composta tanto por escravos como por trabalhadores livres pobres. As eleições não eram representativas e os eleitos quase sempre eram representantes de uma minoria poderosa da sociedade.

Entre 1500 e 1530, não houve interesse de Portugal em ocupar a recém-descoberta colônia, mas com a expansão do comércio e com as descobertas de riquezas, a Coroa portuguesa iniciou, a partir de 1530, um processo de povoamento e controle administrativo da colônia. Chegando ao Brasil, Martim Afonso de Sousa foi nomeado governador-geral pelo rei de Portugal.

Para administrar a Vila de São Vicente, por ele fundada, foi constituída a primeira Câmara Municipal do Brasil, instituição que até hoje existe, seguindo o modelo já utilizado em Portugal. As leis conhecidas como Ordenações do Reino eram responsáveis pela organização político-administrativa das vilas e cidades. De 1500 a 1822, houve três ordenações: Afonsinas (1446-1521), Manuelinas (1521-1603) e Filipinas (1603-1828).

Leia MaisA marcha das Eleições: A atribulada vida republicana no BrasilA marcha das Eleições: As Constituições do BrasilA Câmara Municipal era constituída por dois a quatro vereadores, dependendo do tamanho do município, com mandato de três anos; por um ou dois juízes ordinários, que presidiam as sessões e por uma burocracia formada por escrivães, tesoureiros e dois almotacés, que eram os responsáveis pela fiscalização das obras públicas.

A eleição era indireta, e somente os chamados “homens bons” podiam votar, indicando o nome de seis pessoas que seriam votantes de segundo grau.

Das eleições eram excluídos os trabalhadores, degredados e judeus. Ainda que as mulheres pudessem votar, os eleitores quase sempre eram homens “chefes de famílias, nobres de linhagem e seus descendentes, senhores de engenho, a alta burocracia civil e militar e os comerciantes ricos”.

Aos vereadores cabia a construção e conservação dos logradouros públicos, a denúncia de crimes e contravenções, o auxílio aos alcaides no policiamento e até o julgamento, sem direito a apelação, dos infratores da lei. Exerciam, assim, funções executiva, legislativa e judiciária. A partir de 1603, as atribuições das Câmaras Municipais foram reduzidas significativamente, com a criação de outros ofícios.

A coroa se responsabilizava pela nomeação dos Governadores Gerais, Vice-Reis e encargos de nível provincial, sem participação popular.

A chegada da Família Real e o processo eleitoral no tempo do Império

No século XIX, em 1808, a Família Real chegou ao Brasil modificando o sistema vigente, e em 1821 foi promulgada a lei que convocava as primeiras eleições gerais do Brasil. Também no império, segundo a Constituição de 1824, a condição de eleitor era restrita a uma minoria que excluía as mulheres, a população escravizada e os indígenas.

Neste tempo começam a se desenvolver no Brasil dois grandes vícios que por muito tempo vão perdurar: O voto de cabresto e o coronelismoAssim como se usa o cabresto para prender um animal ou para direcionar sua marcha, a condução do eleitor pelo voto de cabresto evidenciava sua submissão e conformidade à vontade de seu superior, evidenciando o autoritarismo e a interferência na livre escolha eleitoral.

Leia MaisA marcha das Eleições: Os três poderes da RepúblicaA marcha da Eleições: A História do Voto no BrasilNo tempo da República Velha ou Primeira República, quando as eleições passaram a acontecer em regime de voto aberto, o coronelismo reinou à vontade. O voto secreto somente foi introduzido no país após a Revolução de 1930, com o Código Eleitoral de 1932 e a Constituição de 1934.

A necessidade de se escrever na hora da escolha e o fato da maioria dos brasileiros serem analfabetos facilitava em muito a existência do voto de cabresto, como expressão do poder político das elites regionais brasileiras.

No fenômeno do coronelismo, em geral um grande fazendeiro ou um mandatário local se utilizava de seu poder para garantir a eleição dos candidatos que apoiava. Os eleitores podiam ser pressionados e fiscalizados por jagunços ou capangas para votarem nos candidatos indicados, numa evidente mostra de intimidação física e moral, onde o recurso à violência não era exceção.

O advento da República

Quando a república foi proclamada, as eleições continuaram excluindo negros, pobres, analfabetos e o maior contingente populacional da época, as mulheres.

Leia Mais90 anos da conquista do voto feminino: o que mudou de lá para cáNestas circunstâncias, as mulheres da elite começaram a reivindicar um maior espaço na cena política. Por meio de manifestações, reuniões, publicações em jornais, participação em grupos e associações deram forma ao movimento feminista, responsável direto pela conquista do voto, que aconteceria em 24 de fevereiro de 1932, com inscrição no código eleitoral provisório referendada na Constituição de 1934.

Apesar das mulheres representarem hoje mais da metade do eleitorado brasileiro, o número de prefeitas eleitas ainda é muito pequeno. Em 2020, apenas 12,2% dos mais de 5,5 mil municípios brasileiros elegeram mulheres para o cargo de chefe do Executivo, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

A sub-representação feminina afeta a elaboração das políticas públicas dedicadas às mulheres nos municípios. Uma maior presença feminina na política impactará na formulação e decisão de políticas públicas diferentes daquelas que são formuladas e decididas hoje.

Escrito por:
Padre Inácio Medeiros C.Ss.R.
Pe. José Inácio de Medeiros, C.Ss.R.

Missionário redentorista graduado em História da Igreja pela Universidade Gregoriana de Roma, já trabalha nessa área há muitos anos, tendo lecionado em diversos institutos. Atuou na área de comunicação, sendo responsável pela comunicação institucional e missionária da antiga Província Redentorista de São Paulo, tendo sido também diretor da Rádio Aparecida.

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