Brasil

De Zumbi dos Palmares ao movimento contra o preconceito e discriminação

Padre Inácio Medeiros C.Ss.R.

Escrito por Pe. José Inácio de Medeiros, C.Ss.R.

19 NOV 2024 - 13H40 (Atualizada em 19 NOV 2024 - 16H07)

Joa Souza / Shutterstock

A escravidão na história

A escravidão era uma realidade presente em quase todas as civilizações antigas, associada na maioria das vezes com as guerras. O lado vencedor quase sempre levava os derrotados como prisioneiros reduzidos à condição de escravidão. Em Atenas e Esparta, principais cidades-estados da Grécia, por exemplo, era comum que esses escravos fossem pessoas de áreas dominadas pelos exércitos das duas cidades, algo que também era comum na Mesopotâmia e no Egito. As Sagradas Escrituras nos contam a escravidão do Povo Hebreu no Egito até ser libertado por Deus através de Moisés.

Na Roma Antiga acontecia o comércio de pessoas escravizadas para a realização de trabalhos na agricultura, nas obras do império, como na construção de estradas e aquedutos, como também para serem remadores nos navios de guerra. A situação mais complicada era dos escravos treinados para se tornarem gladiadores. Mas havia também os malabaristas, músicos e pedagogos.Leia MaisDia da consciência negra: Somos todos irmãos em Cristo

No Reino de Nápoles, no tempo do nascimento de Santo Afonso Maria de Ligório, no século XVII, havia cerca de 10 mil escravos, muitos deles tinham sido pessoas livres que perderam a liberdade por causa de dívidas, empregados então no duro trabalho das galés ou como serviçais nos castelos da nobreza. É certo que Santo Afonso teve contato com a realidade da escravidão, pois o seu pai, Giuseppe de Ligório, era o comandante da esquadra real.

Com o passar do tempo, o regime de escravidão acabou se espalhando para outras regiões do globo, especialmente após a descoberta das Américas e a colonização da África. A partir de então a justificativa para a escravização das pessoas deixa de ser unicamente por motivo de dominação para se tornar racial.

Escravidão negra, base da economia colonial

No apogeu do sistema capitalista mercantil a partir dos séculos XV e XVI, a economia das colônias como o Brasil se assenta sobre três bases: a grande propriedade territorial (latifúndio), na qual se desenvolvia um empreendimento comercial destinado a fornecer matérias-primas à metrópole (em particular a cana-de-açúcar) e os metais preciosos. O segundo elemento era a monocultura, porque se produzia um só tipo de cultura e o terceiro elemento era a utilização massiva da mão-de-obra escrava. A opção pelo trabalho escravo no início da Idade Moderna explica-se basicamente pela dificuldade de encontrar trabalhadores assalariados dispostos à imigração e pelo custo que isso traria.

Além disso, seria difícil manter assalariados os semi-assalariados nas grandes propriedades. Com a disponibilidade de terras, eles poderiam tentar outras formas de vida tornando-se artesãos, posseiros e pequenos agricultores, por exemplo, o que complicaria o fluxo de mão de obra para a empresa mercantil, na qual os grandes comerciantes e proprietários estavam associados às coroas das metrópoles como Portugal, Espanha e outras.

Comunidades negras

Os quilombos podem ser definidos como comunidades fundadas por escravos de origem africana que conseguiam fugir de seus senhores e das propriedades onde eram escravizados. Eles existiram no Brasil e em outras partes do continente americano onde acontecia a exploração do trabalho de escravos de origem africana.

Nas áreas de colonização portuguesa eram chamados de quilombos ou mocambos; eram conhecidos como marrons nas áreas de colonização inglesa, como no sul dos atuais Estados Unidos; palenques nas áreas de colonização espanhola, predominando em Cuba e Colômbia, e grand marronage, nas áreas de colonização francesa, como no Haiti.

Os quilombos eram de diversos tamanhos. Os pequenos tinham de vinte a trinta habitantes, e outros grandes, com centenas ou milhares de habitantes.

Os quilombos representavam uma resistência ao sistema escravista e também uma forma coletiva de manutenção da cultura africana aqui no Brasil. O personagem Zumbi lutou até a morte por esta cultura e pela liberdade do seu povo.

O Quilombo dos Palmares

O maior e mais famoso de todos os quilombos brasileiros foi o de Palmares. Na verdade, Palmares era um conjunto de vários quilombos. Estima-se que, por volta de 1671, sua população tenha chegado a 20 mil habitantes mais ou menos. Justamente por causa dessa fama criou-se o mito em torno de Palmares e de um dos seus líderes, Zumbi, com várias imprecisões e fantasias.

Localizado na serra da Barriga, região onde hoje estão os estados de Alagoas e Pernambuco, o nome, Palmares vem do fato de a região possuir um grande número de palmeiras.

Segundo algumas fontes, Palmares teria surgido por volta de 1597, quando cerca de quarenta escravos fugiram de um engenho de açúcar no litoral do Nordeste e se refugiaram na região. A mais antiga referência sobre Palmares está numa carta escrita em 1597 pelo padre Pero Lopes, superior dos jesuítas em Pernambuco, ao rei de Portugal.

As notícias sobre o Palmares começaram a circular e o quilombo começou a atrair mais e mais escravos fugidos de engenhos, especialmente de Pernambuco.

Além de negros, a população de Palmares era composta por mestiços, indígena e até brancos, como os indivíduos que eram procurados pelas autoridades da época.

Com as invasões holandesas no Nordeste (1624-1654), os engenhos se desorganizaram e a diminuição da vigilância facilitou as fugas. E muitos fugitivos procuravam Palmares. Além disso, as autoridades portuguesas no Brasil ofereceram alforria (libertação) aos escravos que guerreassem contra os holandeses.

Assim, muitos escravos recrutados aproveitaram para desertar, refugiando-se em Palmares.

O quilombo chegou ao fim quando o bandeirante Domingos Jorge Velho organizou, no ano de 1694, um grande ataque na região. Após uma intensa batalha, a sede do quilombo foi totalmente destruída e Zumbi, o seu líber, conseguiu fugir, porém, traído por um antigo companheiro, foi entregue as tropas do bandeirante, seno morto de forma cruel aos 40 anos, em 20 de novembro de 1695.

Dia da Consciência negra

O dia 20 de novembro foi escolhido como o Dia da Consciência Negra, recordando a morte de Zumbi, líder do Quilombo dos Palmares, servindo motivadora para a conscientização e reflexão sobre a importância da cultura e do povo africano na formação da cultura nacional.

Os descendentes dos povos negros africanos colaboraram muito, durante nossa história, nos aspectos políticos, sociais, gastronômicos e religiosos de nosso país.

Devemos comemorar muito este dia nas escolas, nos espaços culturais e em outros locais, valorizando a cultura afro-brasileira, mas, sobretudo, esta data, como tantas outras, deve ser um levantar de vozes contra as muitas formas de preconceito que existem em nosso meio, atingindo não apenas os negros, mas a outros grupos humanos como os pobres, as mulheres e os deserdados da sociedade.

Escrito por:
Padre Inácio Medeiros C.Ss.R.
Pe. José Inácio de Medeiros, C.Ss.R.

Missionário redentorista graduado em História da Igreja pela Universidade Gregoriana de Roma, já trabalha nessa área há muitos anos, tendo lecionado em diversos institutos. Atuou na área de comunicação, sendo responsável pela comunicação institucional e missionária da antiga Província Redentorista de São Paulo, tendo sido também diretor da Rádio Aparecida.

Seja o primeiro a comentar

Os comentários e avaliações são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião do site.

0

Boleto

Carregando ...

Reportar erro!

Comunique-nos sobre qualquer erro de digitação, língua portuguesa, ou de uma informação equivocada que você possa ter encontrado nesta página:

Por Redação A12, em Brasil

Obs.: Link e título da página são enviados automaticamente.

Carregando ...