Por séculos, a fase da infância foi subestimada pelos adultos e a sua relevância para a maturação e desenvolvimento integral do indivíduo foi totalmente minimizada pela sociedade. Na Idade Média, as crianças eram vistas como 'mini-adultos' diante da falta de conhecimento desta fase da vida. Somente a partir do século XVII é que a criança começa a ser percebida como um ser distinto do adulto. Tal percepção ganha maior enfoque principalmente no século XX, quando Freud enfatiza a importância da infância e a influência que os momentos vividos neste período podem gerar para toda a vida, seja positivamente ou negativamente.
Leia MaisUma educação prudente ensina a virtude
Mas será que a educação infantil hoje considera os aspectos cognitivos da criança, a fim de estimular suas capacidades? E que influência tal fator geraria para o desenvolvimento econômico de um país como o Brasil, por exemplo? Toda a influência.
De acordo com o Relatório do Desenvolvimento Humano (RDH), emitido pela Organização das Nações Unidas, o Brasil é a décima nação com maior taxa de desigualdade social do mundo. Entre os fatores fomentadores de tal posição, está um dos pilares essenciais para o avanço de um país como um todo: a educação. Mas não se trata apenas de inserir uma quantidade cada vez maior de jovens e crianças na sala de aula, mas oferecer educação de qualidade para esses estudantes.
Dados do Relatório de Desenvolvimento Global WDR 2018, realizado pelo Banco Mundial, mostram que, apesar de estarem matriculados em instituições de ensino, muitos estudantes não estão aprendendo. O mesmo documento também aponta para a desigualdade de acesso à educação entre populações ricas e pobres, pois, em nações de renda considerada baixa ou média, mais da metade das crianças não apresenta desempenho mínimo em leitura e matemática. No Brasil, segundo o MEC, 55% dos alunos do 3° ano apresentam aprendizado insuficiente em leitura e matemática e 34% em escrita. Mas o problema muitas vezes começa lá atrás, na Educação Infantil, vista às vezes como um período para a criança passar o tempo enquanto os pais ou responsáveis trabalham.
Em uma entrevista publicada na edição de 27 de setembro de 2017 na Revista Veja, o ganhador do prêmio Nobel de Economia, James Heckman, ressalta a importância do investimento educacional nos primeiros anos de vida de um aluno para a evolução de uma nação. Para ele, os estímulos nos primeiros anos de vida são decisivos para a idade adulta, pois trata-se de uma fase em que o cérebro se desenvolve freneticamente e tem um enorme poder de absorção. São as primeiras impressões e experiências de vida que configuram o caminho para o desenvolvimento do conhecimento e das emoções ao longo do tempo. Por isso, a importância de uma base fortalecida para o aprimoramento do ser humano.
Jean Piaget (1896-1980) já ressaltava a importância dos estímulos ambientais, por meio do desenvolvimento contínuo de estruturas que garantam a adaptação do organismo ao meio, como forma de alavancar a inteligência da criança. Lev Vygotsky (1896-1934) também abordava como os estímulos são essenciais para o desenvolvimento cognitivo ao destacar que, através da interação com as pessoas que a rodeiam, a criança internaliza novas informações e adquire conhecimento (LAKOMY, 2014).
Heckman defende o impacto positivo de programas que envolvam famílias desfavorecidas, creches e pré-escolas, centros de saúde e outros órgãos que, integrados, possam canalizar incentivos às crianças. Para ele, países que não investem na primeira infância possuem maiores índices de criminalidade, taxas de gravidez na adolescência, evasão escolar e menores níveis de produtividade.
Por isso, ao investir em educação, é essencial que o governo tenha um olhar diferenciado para a Educação Infantil, considerada a base de todo o ensino. A criança bem instruída nesta etapa se sentirá mais capacitada para exercitar seu aprendizado ao longo dos anos e, assim, ter maior preparo para sua inserção no mercado de trabalho, com um salário melhor. Uma verdadeira inclusão educacional deve começar pela base, para reduzir as desigualdades sociais, melhorar a produtividade do país e, consequentemente, sua economia.
É preciso priorizar qualidade e não apenas quantidade; oferecer salários dignos aos professores e meios que desenvolvam o aprendizado efetivo dos estudantes. Um investimento qualitativo que deve perpassar todas as fases da educação, da Infantil ao Ensino Superior.
Não é de hoje que se fala na educação como aspecto fundamental para mudanças, mas o que realmente se faz na prática? Durma-se com este barulho.
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