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Dúvidas Religiosas

O que significa a criação ou nomeação 'in pectore'?

É uma forma válida pelo Código de Direito Canônico de nomear um cardeal sem revelar seu nome, sendo um segredo do papa

Escrito por Beatriz Nery

25 FEV 2025 - 14H13 (Atualizada em 26 FEV 2025 - 10H46)

Você já ouviu falar de cardeais “in pectore”?

Esse termo do Vaticano significa que um papa nomeou um cardeal sem divulgar seu nomeAo longo da história, essa forma de criação envolveu perseguições, estratégias diplomáticas e até segredos nunca revelados. 

A expressão em latim “in pectore” significa “no coração”. Quando um pontífice nomeia um cardeal dessa forma, ele guarda essa escolha em segredo.

Riccardo De Luca/ Shutterstock
Riccardo De Luca/ Shutterstock


A nomeação “in pectore” protege líderes católicos em países onde há perseguição religiosa. Mesmo hoje, com tantas informações acessíveis, o Vaticano pode usar essa estratégia para garantir a segurança de seus escolhidos.

Segundo o artigo 3 do cânone 351 do Código de Direito Canônico:

“A pessoa promovida à dignidade cardinalícia, cuja criação o Romano Pontífice anunciar, reservando para si o nome 'in pectore', não fica, entretanto, obrigada a nenhum dever dos Cardeais nem goza de nenhum dos seus direitos; a partir da publicação do seu nome pelo Romano Pontífice, fica obrigada aos mesmos deveres e usufrui dos mesmos direitos, mas goza do direito de precedência desde o dia da reserva in pectore.”

Ou seja, o nomeado só passa a ter direitos e deveres de cardeal quando sua identidade é revelada.

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No filme Conclave (2024), há uma representação incorreta desse conceito, sugerindo que uma nomeação “in pectore” poderia permanecer válida ao ser anunciada por um religioso mesmo após a morte do Papa.

Essa abordagem não está de acordo com a realidade canônica. A nomeação “in pectore” é um ato pessoal do Papa e sua validade depende exclusivamente dele. Se ele não revelar a identidade do cardeal antes de sua morte, a nomeação é considerada nula.

Essa liberdade artística — ou erro — no filme pode ser entendida como uma dramatização para fins narrativos, mas não reflete a prática real da Igreja.

Conclave, o filme / Divulgação
Conclave, o filme / Divulgação


A origem do segredo

A prática surgiu no século XVI no pontificado de Paulo III (1534–1549), mas foi Martinho V quem, antes dele, indicou um prelado sem divulgar seu nome para evitar perseguições.

No século XIX, os papas usaram essa estratégia com frequência. Na época, o Vaticano também exercia poder político, o que obrigava o pontífice a lidar com governos hostis. Manter a nomeação em sigilo protegia os escolhidos de retaliações.

Nomeações “in pectore” ao longo da história

Entre 1900 e 2005, apenas 12 cardeais foram nomeados dessa forma. O primeiro foi o português Antônio Mendes Bello, em 1911. Ele foi expulso de Lisboa, acusado de desrespeitar a separação entre Igreja e Estado. Sua identidade só foi revelada três anos depois.

Outro caso emblemático aconteceu em 1933, com Federico Tedeschini, que era embaixador do Vaticano na Espanha, em meio a um forte sentimento anticlerical. Ele foi reconhecido como cardeal dois anos depois.

Marco Iacobucci Epp / Shutterstock
Marco Iacobucci Epp / Shutterstock


Os cardeais que nunca tiveram seus nomes revelados

Em 1960, o Papa João XXIII nomeou três cardeais “in pectore”, mas nunca divulgou seus nomes. Quem eram eles? Ninguém sabe.

A Guerra Fria trouxe novos desafios para a Igreja. Durante o pontificado de Paulo VI, três cardeais foram nomeados secretamente. Um deles, Iuliu Hossu, bispo romeno, passou 16 anos preso e morreu sem saber que havia sido feito cardeal. Sua condição só foi revelada em 1973, três anos após sua morte.

Os outros dois eram Frantisek Tomasek, da Tchecoslováquia, e Joseph-Marie Trinh-nhu-khue, do Vietnã. Ambos foram reconhecidos ainda em vida.

São João Paulo II e os últimos cardeais “in pectore”

O último, São João Paulo II, nomeou quatro cardeais dessa forma. O mais famoso foi o bispo chinês Ignatius Kung Pin Mei. Ele estava preso quando foi nomeado, em 1979, e sua identidade só foi revelada em 1991. Ele morreu exilado nos Estados Unidos em 1998. 

Os outros dois foram Janis Pujatz, da Letônia, e Marian Jaworski, da Ucrânia. Ambos foram reconhecidos em 2001.

giulio napolitano/Shutterstock
giulio napolitano/Shutterstock


Essa antiga tradição não caiu realmente em desuso, mesmo que Bento XVI nunca a tenha usado e Francisco ainda não

O Papa Francisco provavelmente não sentiu a necessidade de empregá-lo. Pequim e a Santa Sé pacificaram timidamente suas relações com um acordo em 2018. No entanto, dadas as tensões que ressurgiram ao redor do mundo desde a guerra entre Moscou e Kiev, ou mesmo a situação na Nicarágua, não está totalmente fora de questão que cardeais in pectore possam ressurgir.

:: O que é um Cardeal? Confira as principais dúvidas sobre o título

Fonte: Vatican News/Folha de São Paulo/Katholikos Brasil/Aleteia

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