A Bíblia conta, no capítulo 4 do Gênesis, que Caim, filho de Adão e Eva, era agricultor, ao passo que seu irmão Abel era pastor de ovelhas. Nessa história sobre uma fraternidade fracassada, temos no Texto Sagrado a primeira menção da palavra “irmão”, usada sete vezes. A narrativa é breve, limitando-se ao essencial, e não satisfaz a nossa curiosidade de saber mais sobre a vida deles, seus sentimentos e motivações.
Cada qual oferecia a Deus os frutos de seu trabalho, mas o sacrifício de Caim não teve boa aceitação como tinha o de Abel. Na Missa, a gente reza “para que o nosso sacrifício seja aceito por Deus Pai todo-poderoso”. Que seja uma oferta sincera, feita de bom coração, sinal de nosso louvor e gratidão. Certamente nisso Caim falhou. E ficou com inveja e ciúmes do irmão, bem acolhido por Deus.
São João escreve na sua 1ª Carta que as obras de Caim eram más (3,12). Tentando evitar sua ruína, Deus o avisou, mostrando que o domínio do homem sobre os animais tinha que se estender ao animal interior de cada ser humano, ou seja, os maus instintos. Aconteceu a tragédia e Deus puniu o crime, mas colocou no assassino um sinal que o protegesse de qualquer agressão. Deus rejeita o pecado, mas não o pecador, que continua sendo Seu filho.
Leia MaisPecado mortal tem perdão?Com a história de Caim e Abel a Bíblia quer ensinar que nenhum assassino mata um estranho, um desconhecido: quando alguém mata um ser humano, está tirando a vida de um irmão, seja ele quem for.
Sobre esse episódio bíblico, o autor argentino Jorge Luis Borges escreveu um conto, no qual imagina os dois irmãos se encontrando depois que tudo aconteceu. Caim vê na testa do irmão a marca da agressão assassina e lhe suplica o perdão pelo seu crime.
A resposta de Abel é surpreendente: “Mas foi você que me matou ou fui eu que o matei? Não me lembro mais; estamos aqui juntos como antes”. E Caim responde: “Agora sei que já me perdoou, porque esquecer é perdoar. Eu também vou procurar esquecer, não aguento mais viver com este remorso.”
Comentando esse lindo conto, pode-se perguntar: Que dizer às pessoas que falam: ‘Eu perdoo, mas não esqueço’? Será necessário esquecer para perdoar? Nossa memória é uma faculdade que registra tudo, não depende da nossa vontade. Por isso, nossa atitude deve ser não reavivar as más lembranças. Fazer como Deus faz com nossos pecados: Ele os joga no fundo do mar – diz o profeta Miqueias (7,19).
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