Em quais situações a família pode ser o alicerce de alguém? Precisamos da família por toda a vida? Podemos viver bem sozinhos?
Comecemos por uma imagem que não é alheia a nenhum de nós: no parque, uma criança encontra-se junto dos pais tentando aprender a andar de bicicleta. Sabemos, por experiência própria, que a chave para finalizar tal aprendizado está no momento em que o pai deixa a criança continuar sozinha. Os pais sabem o risco de dar esse passo, mas ao mesmo tempo o sabem necessário para que a criança possa se desenvolver.
.:: Oração pela Igreja e pela Família
Seguindo a analogia, percebemos que, no caminho do amadurecimento, é necessário abrir mão de algumas seguranças externas e cultivar uma autonomia saudável.
Nesse sentido, lembro da reflexão de um amigo que trabalha na formação de jovens: os jovens de hoje têm muitos meios para ser independentes, mas não conseguem ser autônomos, não conseguem valer-se por si mesmos.
.:: Posso ser reflexo da Palavra de Deus na minha família?
Quer se verifique isto em mais ou menos jovens, quer se aplique a pessoas mais novas ou mais velhas, percebemos que o mundo de hoje oferece muitas seguranças e instrumentos que podem dar a ilusão de estarmos alicerçados, prontos para enfrentar tudo, sem que realmente seja assim.
Por outro lado, voltando ao âmbito da família, o que define a saúde da autonomia buscada?
Assim chegamos a uma primeira resposta: na família os vínculos nunca são cortados, as relações não são extintas. Ser filho – e ser irmão, e ser sobrinho, e ser neto – fazem parte da identidade desde o nascimento. Nunca deixa-se de ser filho, mas isso não faz desta pessoa um tipo de extensão dos pais. Esta pessoa, cuja identidade inclui relações, constrói seu próprio caminho com as decisões que vai fazendo na vida.
Talvez uma aproximação mais feliz do que a de alicerce – um apoio que me sustenta – seja olhar para a família como base, o chão sobre o qual consigo ficar de pé e começar a caminhar. É preciso que cada pessoa vá fazendo suas próprias opções, vá aprendendo a responder por elas. Não como superação de um tipo de estágio inicial da identidade, mas justamente como um progresso baseado nessa identidade histórica e situada.
Uma observação importante: cultivar uma autonomia saudável não significa se isolar dos demais, incluindo – é claro – a família. Aliás, o quarto mandamento nos lembra, como primeira ação concreta do amor ao próximo, o honrar pai e mãe. Isso implica respeito e acolhida, assim como atenção e assistência “nos anos da velhice e no tempo da doença, da solidão ou do desânimo” (CEC, 2218), isso tudo a partir de um profundo senso de gratidão.
Tentando concluir e de alguma forma responder às perguntas iniciais, acho que a família pode ser o alicerce da pessoa, na medida em que a ajude a crescer e amadurecer no uso responsável da sua própria liberdade, a cultivar uma autonomia saudável.
Nossas decisões – na medida em que tivermos amadurecido o suficiente – não precisam estar alicerçadas na aprovação da família; mas não podemos esquecer que as relações familiares fazem parte da sua identidade histórica, fazem parte de quem somos. E, sabiamente, devemos levar em consideração a opinião das pessoas que nos conhecem e que fazem parte da nossa história.
E, sim, pode-se viver bem sozinho, na medida em que esse fato não se oponha à profunda verdade do homem ter sido criado para a comunhão.
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