História da Igreja

A evolução do clero ao longo dos tempos

Padre Inácio Medeiros C.Ss.R.

Escrito por Pe. José Inácio de Medeiros, C.Ss.R.

17 ABR 2024 - 08H55 (Atualizada em 17 ABR 2024 - 10H16)

Thiago Leon

Segundo os dados mais atualizados, o número de católicos no mundo é de 1,3 bilhões, com um crescimento de seu número em todos os continentes, menos na Europa. A porcentagem de católicos chegou a 17,67% da população mundial.

De acordo com a Santa Sé, hoje existem 407,8 mil padres no mundo, sendo 279,6 mil diocesanos e 128.262 religiosos. No Brasil, segundo dados da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) em 2023 existiam 22,1 mil padres, sendo 15,2 mil diocesanos e 6,9 mil religiosos.

Este é apenas um aspecto da realidade atual, mas para que chegasse a esta realidade, como tudo o que acontece na Igreja e na sociedade a organização do clero católico também passou por uma longa evolução.

Origem e formação

O clero tem raízes históricas, remontando ao tempo das primeiras comunidades cristãs, que foram surgindo logo após Pentecostes, no tempo dos apóstolos.

Com a morte dos apóstolos e com a organização ministerial das comunidades cristãs, os membros do clero foram ganhando relevância, no seio da Igreja, se tornando os responsáveis pela administração das práticas religiosas do cristianismo, sobretudo, as que são ligadas à administração das comunidades e paróquias e às funções litúrgico-sacramentais.

Os apóstolos, pela autoridade recebida do próprio Cristo, foram os primeiros líderes religiosos da nascente Igreja (Ecclesia) Cristã, mas à medida que o cristianismo se expandiu entre os gentios e com sua entrada nas mais diversas províncias do Império Romano, surgiu a necessidade de melhorar sua estrutura e organização.

Gradualmente, a hierarquia eclesiástica se desenvolveu e os que passaram a serem ordenados para uma missão, no grau do sacerdócio ministerial — bispos, presbíteros e diáconos — assumiram funções específicas dentro da igreja.

Thiago Leon
Thiago Leon


No Império Romano, após mais de três séculos de perseguição, o cristianismo ganhou liberdade sob o imperador Constantino no ano de 313, início do século IV. Isto levou a um maior crescimento do número de cristãos e o consequente aumento da influência do clero. Mais tarde, em 395, com o imperador Teodósio, o cristianismo foi oficializado como a única religião do império. Alguns bispos se tornaram figuras importantes, com poder político e influência social, participando inclusive como conselheiros do próprio imperador.

Com a derrocada, o Império Romano devido à invasão dos Povos Germânicos, por volta do século V, a Igreja se tornou a única instituição a resistir aos diversos ciclos de invasões que durariam quase mil anos, e apesar da queda do império pode continuar sua missão, trabalhando na evangelização dos novos reinos que se formaram no lugar do anterior império unificado e centralizado.

A organização do clero na Idade Média

No início do período medieval, na Alta Idade Média, a Igreja Católica Romana se consolidaria como uma das instituições mais poderosas da Europa, se rivalizando com o patriarcado da Igreja Ortodoxa Bizantina e com o próprio imperador do Sacro Império. Se um imperador não fosse sagrado e coroado pelo papa, não teria sua autoridade legitimada e nem contaria com o apoio e submissão de seus súditos.

A autoridade do clero, sobretudo, a dos bispos e do papa, não podia ser contestada, pelo fato de ocuparem os primeiros lugares da pirâmide da organização social. Isto se dava também pela razão do clero, especialmente os membros do Alto Clero, ser a única classe letrada de então.

Neste período o clero passou a vestir-se de forma diferente do povo, os bispos começam a usar insígnias, que os identificavam com os ocupantes de funções políticas e o próprio papa passa a se vestir diferente de todos os demais.

Ainda na Idade Média começaram a surgir as casas, que hoje são chamadas de seminários, específicas para a formação dos candidatos ao sacerdócio, pois até então eram formados no convívio e no contato com aqueles que já exerciam o ministério sacerdotal.

Os desafios da Idade Moderna

Na Idade Média, o clero católico exerceu um grande poder e influência na sociedade. Os sacerdotes desempenhavam um papel essencial na vida religiosa das pessoas, administrando sacramentos, oferecendo orientação espiritual e atuando como mediadores entre Deus e os fiéis.

A vida das pessoas era marcada pelo aspecto religioso, seja nos horários, nos atos quotidianos, como também na forma de se viver. No entanto, esse poder e influência também gerariam críticas e questionamentos, levando a movimentos de reforma que nem sempre eram totalmente concluídos.

Neste tempo já se falava da necessidade de uma reforma que atingisse “a cabeça e os membros da Igreja”, porém, na maioria das vezes a reforma atingia os seus membros da Igreja e não conseguia chegar à cabeça (hierarquia), porque muitos de seus membros estavam presos a mordomias e privilégios, levando uma vida que muitas vezes não condizia com o juramento realizado e com o celibato assumido.

No fim do século XV e início do século XVI aconteceram alguns movimentos mais agressivos como a Reforma Protestante liderada por Martinho Lutero. A partir do momento em que estes movimentos passaram a ser usados pelos reis e príncipes com finalidade política, os prejuízos foram grandes não apenas para a Igreja, mas para toda a sociedade.

Thiago Leon
Thiago Leon


A Reforma Protestante, além de dividir a Igreja,
criando distintas igrejas separadas, provocou a guerra religiosa conhecida como Guerra dos Trinta Anos, que envolveu a maioria das potências da Europa no conflito que durou de 1618 a 1648.

Se a Idade Média foi marcada pela ruralização da economia e pela mudança da maioria da população para a zona rural, na Idade Moderna que estava começando o processo se inverteu, com as cidades voltando a crescer, com a sociedade se movimentando. Desde então, a Igreja passou conviver com alguns fenômenos como o racionalismo, a secularização e o anticlericalismo que ainda hoje marcam a sociedade e a Igreja.

Conviver com a Pós-Modernidade

A Reforma Protestante e as mudanças do mundo no período da Idade Moderna provocaram mudanças significativas na estrutura da Igreja e na organização do clero. A Igreja iniciou um movimento conhecido como Contrarreforma, buscando recuperar o tempo perdido, sobretudo a partir do Concílio de Trento.

Novas denominações cristãs foram surgindo num movimento de multiplicação cada vez mais acelerado como se percebe ainda hoje, cada uma com sua própria interpretação da Bíblia e com a própria hierarquia clerical.

Muitas orientações do Concílio de Trento vigoraram até os nossos tempos, sendo suplantadas a partir dos anos de 1960 pelo Concílio Vaticano II, que orientou o clero para uma vida mais simples e despojada, com os padres se inserindo nos mais diversos ambientes, com a Igreja se estruturando cada vez mais como uma Rede de Comunidades que chega aos nossos dias, inspirada na bonita utopia da sinodalidade.

Reprodução/ Wikipedia
Reprodução/ Wikipedia


Apesar da onda de neoconservadorismo que vem crescendo nas últimas décadas, a presença do clero nas comunidades e paróquias é essencial para nortear o rumo de sua caminhada para que a Igreja, vivendo hoje os desafios da Pós-Modernidade, possa bem cumprir a sua missão.

Em síntese, a origem e ascensão do clero estão intrinsecamente ligadas com a história do catolicismo nas mais diferentes culturas e civilizações. Desde os primeiros tempos do cristianismo até chegar à Igreja organizada e presente nos quatro cantos do mundo como temos hoje, o clero sempre desempenhou e continuará desempenhando uma missão vital na liderança espiritual da Igreja de Jesus Cristo.

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Escrito por:
Padre Inácio Medeiros C.Ss.R.
Pe. José Inácio de Medeiros, C.Ss.R.

Missionário redentorista graduado em História da Igreja pela Universidade Gregoriana de Roma, já trabalha nessa área há muitos anos, tendo lecionado em diversos institutos. Atuou na área de comunicação, sendo responsável pela comunicação institucional e missionária da antiga Província Redentorista de São Paulo, tendo sido também diretor da Rádio Aparecida.

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