Recentemente, o Brasil viveu duas grandes expressões de luto coletivo: Uma pelo trágico acidente ocorrido com um avião na cidade de Vinhedo (SP) em 9 de agosto e outra pela morte do apresentador e empresário Silvio Santos, no dia 17 desse mês.
Nessas horas, se destaca de forma mais intensa, o enigma que a morte representa, pois diante de acontecimentos, ceifando a vida de tanta gente, as pessoas são levadas a refletir sobre o sentido da vida e da morte. Trata-se de uma realidade complexa e desafiadora para qualquer ser humano.
Por outro lado, as pessoas também se perguntam sobre as diferenças dos rituais e comportamentos relacionados com o luto e com a despedida final de quem faleceu.
O sentido da perda
A perda de um ente querido é a prova mais dolorosa que enfrentamos em nossa breve passagem pela terra. Como entender um fato que parece fechar todas as portas à esperança? Como conviver para sempre sem a presença física de quem tanto se ama? Como controlar a saudade que brota dos mínimos gestos e recordações? Saudade que, ao contrário do que se diz, parece que só aumenta com o tempo.
Como suportar o silêncio de uma voz que se calou? E o que fazer para conter as lágrimas diante de fotografias, imagens ou objetos relacionados com um passado que não mais retornará?
Toda perda provoca uma reação imediata que é chamada de luto, um processo que pode se estender por mais ou menos tempo, e a maneira de vivenciá-lo depende de cada um e do real significado daquele ou daquilo que foi perdido.
Segundo especialistas, em geral, o luto é marcado, num primeiro momento, pelo choque diante do inesperado ou do incontrolável, gerando uma espécie de anestesia, principal indicador de que a perda ainda não foi assimilada por completo.
Depois, vem uma fase em que parece que a “ficha cai”, como se diz popularmente e se passa a entender melhor a dimensão do que ocorreu, mas sempre com uma resistência em aceitar. Existem os que chegam a acreditar que irão acordar e a realidade será aquela de sempre.
Quando, finalmente, se percebe que nada mudará, vem o sofrimento, o choro, a falta que a pessoa começa a fazer. Pode acontecer também um momento de revolta e de culpa, quando entra em cena o “SE”: “se tivesse feito diferente”, “se isso…”, “se aquilo…”. Por fim, como em outras perdas, chega-se à aceitação e ao necessário retorno à realidade. O sensacionalismo e a forma como a mídia trata ou explora as tragédias é um complicador que acentua a dor e a forma de aceitação da realidade.
Sentido da vida e da morte
O advento do cristianismo e a saída do Templo, fez com que os cristãos fossem aos poucos dando um tratamento para os corpos dos que morriam, com rituais diversificados em relação ao mundo e à cultura dos judeus.
No Oriente Médio, na Ásia Menor e nas províncias do Império Romano, os cristãos foram dando um sentido diferente à morte e à vida eterna, embalados pela certeza da ressurreição, até que surgiu a celebração de uma data especial de comemoração de todos os fiéis defuntos com o Dia de Finados.
Este costume deriva de Santo Odilon, abade da ordem monástica de Cluny, falecido em 1048, que decretou no ano de 998 que, em todos os mosteiros dependentes de sua abadia, fosse celebrado, depois da festa de Todos os Santos, um dia exclusivamente dedicado aos mortos.
Aos poucos, a celebração desse dia ganhou ampla difusão, passando também para muitos países, principalmente na Europa. Enfim, também em Roma foi sancionada oficialmente a memória de todos os fiéis falecidos em 1311, com celebração para a Igreja de todo orbe.
Muito antes, porém, de a Igreja institucionalizar o Dia de Finados, um livro lançou as bases para fundamentar o modo como os cristãos tratam a vida e celebram os seus mortos. Trata-se do livro “De Cura pro Mortuis Gerenda”, escrito no ano 421, atribuído ao grande Santo Agostinho de Hipona (354-430).
O luto nas diversas culturas e religiões
Desde os primórdios dos tempos, em que o ser humano se encontra sobre a face da terra, as diversas religiões e culturas buscam entender o sentido da morte, do luto, apresentando também as maneiras de trabalhar e suportar a ausência e a perda.
Uma das formas que o ser humano encontrou para reverenciar os seus mortos, enfrentado o luto e a dor, se deu pela criação dos rituais funerários que ganham variadas expressões de acordo com as culturas, religiões e países. Em algumas realidades esse ritual se reveste de colorido e de aspectos folclóricos.
Um dos primeiros povos a praticar certos rituais funerários foi a civilização Celta, que habitava primeiro o centro da Europa, chegando depois a ocupar mais da metade do continente. Sua influência foi se fazendo sobre outros povos e culturas. Quando a Igreja evangelizou a Europa depois da queda do Império Romano em 467, boa parte destes rituais foram cristianizados.
Em alguns países, como o caso do México, ainda hoje são realizadas festas em honra dos mortos com comida, bolos, música e doces, os preferidos das crianças. Em outras regiões como no Suriname e em Nova Orleans, nos Estados Unidos, são realizados cortejos acompanhados de música e danças ao conduzir os falecidos para o lugar de seu último repouso.
Como se pode perceber, as culturas e as sociedades vivem o luto de acordo com uma herança que vem de séculos, dando sentido à experiência da morte, sempre carregada de significados próprios que passam pela espiritualidade e pela religião.
Para compreender o sentido da perda e do luto é preciso ter em mente que, pelo fato do ser humano não ter o conhecimento definitivo do que acontece depois da morte e, mesmo do ponto de vista biológico, o entendimento da morte do corpo é uma compreensão relativamente recente, tudo se reveste de mistério, de incógnitas e até de apreensões.
Na falta de explicações, o ser humano foi construindo significados e esses, ao longo da história, foram pautando comportamentos e atitudes que geraram rituais e cerimônias.
A maneira de realizar o tratamento do corpo de uma pessoa falecida, o velório e o destino final dado ao corpo, pelo sepultamento ou cremação que são as formas mais comuns, são notadas em quase todas as culturas, como foi o caso de Silvio Santos, que por ser judeu seguiu os rituais próprios, bem diferente dos costumes cristãos.
De acordo com a Confederação Israelita do Brasil, dentro da tradição judaica, o enterro acontece rapidamente após o falecimento, se possível no mesmo dia.
Se o falecimento ocorrer no sábado, dia de descanso para os judeus e no qual os enterros são proibidos, deverá ser no dia seguinte, como ocorreu com o apresentador.
O corpo é envolvido em uma mortalha branca, simbolizando igualdade perante a morte, independentemente da posição social do falecido.
Pela tradição, deixar o falecido à mostra demonstra falta de respeito à imagem da pessoa em vida. O mesmo motivo é levado em conta para não abrir o caixão durante o velório, que não é público e se restringe a familiares e amigos. Pela tradição, deixar o falecido à mostra demonstra falta de respeito à imagem da pessoa em vida. O mesmo motivo é levado em conta para não abrir o caixão durante o velório, que não é público e se restringe a familiares e amigos.
O mais importante é que a vida seja soberana sobre a morte e que, independentemente das variações culturais ou mudanças que os tempos trazem, que não se falte com o respeito à dignidade que toda pessoa falecida merece.
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