Por João Antônio Johas Leão Em Igreja Atualizada em 21 MAR 2018 - 11H31

Água que mata a sede

No começo de sua carta Encíclica Laudato Si, sobre o cuidado da casa comum, o Papa Francisco nos lembra que: “A violência, que está no coração humano ferido pelo pecado, vislumbra-se nos sintomas de doença que notamos no solo, na água, no ar e nos seres vivos. [...] Esquecemo-nos de que nós mesmos somos terra (cf. Gn 2, 7). O nosso corpo é constituído pelos elementos do planeta; o seu ar permite-nos respirar, e a sua água vivifica-nos e restaura-nos”. Fica evidente que a falta de cuidado do homem consigo mesmo repercute severamente no restante da criação de Deus.

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Atualmente se tem muito viva a consciência de que é preciso cuidar dos recursos naturais. Mas parece que essa consciência não vai atrelada ao que o Papa menciona, o fato de que nós mesmos somos constituídos pelos elementos do planeta. Ao mesmo tempo que gritamos por todos os cantos que o mundo precisa ser salvo, não acreditamos que nós mesmos precisemos de salvação alguma. Pelo contrário, pareceria, pelo que se escuta, que somos nós mesmos que salvaremos o mundo.

Não é errado pensar que precisamos contribuir para fazer de nossa casa comum um lugar melhor. Esse é justamente o apelo do Papa na encíclica. Mas não o podemos fazer se nos esquecemos de um fator primordial, que é a condição de estarmos feridos pelo pecado, como bem colocou o Papa logo no início da carta. Em Brasília está acontecendo o Oitavo Fórum Mundial da Água. Ali Leia MaisDia Mundial da Água: 'Água e Desenvolvimento Sustentável'Sete atitudes para evitar o desperdício de águase reunirão pessoas que discutirão sobre a crise hídrica, sobre como cuidar melhor da água, inclusive um dia falarão sobre a importância da água nas diferentes religiões. Mas nenhuma proposta será verdadeiramente efetiva se não levar em consideração a nossa condição de seres humanos fragilizados pelo egoísmo do pecado. De formas sempre novas, o egoísmo arranja maneiras de voltar com aspecto de caridade e engana a muitos por muito tempo.

De volta à encíclica, Francisco dedica uma pequena parte especialmente a questão da água. Ali ele aponta que em nosso tempo, as crescentes demandas por água estão fazendo com que a distribuição seja algumas vezes não muito imparcial. Também lembra da delicada situação da África que sofre com regiões muito secas enquanto outras possuem grande abundância. Outro ponto abordado é a questão da qualidade da água disponível, que muitas vezes, não sendo boa, acaba por carregar consigo doenças que podem ser muitas vezes fatais. Francisco diz que a água é um direito humano fundamental, estando diretamente relacionado com o direito a vida, já que sem água, não há vida.

Tudo isso, diz o Papa, “mostra que o problema da água é, em parte, uma questão educativa e cultural, porque não há consciência da gravidade destes comportamentos num contexto de grande desigualdade”. Então a resposta passaria por uma maior conscientização desse grave problema. E parte fundamental dessa conscientização parece ser a maneira como nós nos entendemos no meio de todos esses problemas. Somos os super-homens que com suas capacidades resolverão tudo? Ou somos criaturas também de Deus, que desde a nossa miserável condição cooperaremos com Ele para que sua criação lhe dê Glória?

Espero que o Oitavo Fórum Mundial ajude nesse processo. E que de maneira especial, quando as religiões possam mostrar a importância da água para sua visão de mundo, nós mostremos que é por meio dela que o próprio Deus nos purifica e nos doa uma vida nova, um coração novo. E que a única maneira de realmente se preocupar com a seca hídrica é viver essa vida nova que brota dessa fonte que não seca nunca. Como disse Jesus:

“Aquele que bebe desta água

Terá sede novamente;

Mas quem beber da água que lhe darei,

Nunca mais terá sede.

Pois a água que eu lhe der

Tornar-se-á nele fonte de água

Jorrando para a vida eterna”

(Jo 4, 14)

Escrito por:
João Antonio Johas Leão (Arquivo pessoal)
João Antônio Johas Leão

Licenciado em filosofia, mestre em direito e pedagogo em formação. Pós-graduado em antropologia cristã e entusiasta de pensar em que significa ser cristão hoje.

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