O Dia de Finados é uma antiga tradição, dentro da Igreja Católica e fora dela. Por acreditarem na vida depois da morte, alguns povos procuravam conservar os corpos dos falecidos ou, pelo menos, os seus ossos. Outros enterravam os mortos acompanhados de suas armas e troféus. Outros povos procuravam destruir completamente os ossos do defunto, porque acreditavam que somente deste modo a alma poderia passar para a nova vida.
Alguns povos antigos também acreditavam que os mortos continuavam a viver entre os vivos, a não ser que fossem afastados com danças e cerimônias especiais. O costume de se colocar o cadáver em posição como se ele estivesse dormindo prova a crença na vida depois da morte. Sepulturas feitas já há 70 ou 80 mil anos mostram a crença na vida eterna. É por isso que os egípcios e outros povos embalsamavam e conservavam os corpos.
O missionário redentorista Padre Inácio Medeiros explica que, desde o começo da Igreja, já havia o costume de se celebrar e rezar pelos mortos, recomendando-os à misericórdia de Deus. Mas no começo não havia um dia especialmente dedicado aos mortos. “Somente a partir do século VII é que encontramos referência ao dia dos mortos, mas esse dia era celebrado em datas variadas, dependendo de cada região. Somente por volta do século XI é que começou a ser celebrado no dia 2 de novembro. Daí o costume foi se espalhando rapidamente e, uns 300 anos depois, foi adotado em Roma”, detalha.
Ele salienta que o principal desse dia é celebrar a vida e não a morte. “Celebramos a comunhão dos santos e a nossa caminhada como Igreja, seja na união com os que estão ainda nesta vida, como com os que já faleceram. Celebramos a certeza da ressurreição de Cristo e, se com ele vivemos também com ele ressuscitaremos. Os cristãos, a partir da morte e ressurreição de Jesus Cristo, passam a ter a certeza na vida eterna e por causa disso sabem que a morte é apenas uma passagem, é uma separação apenas parcial e limitada.”
O Catecismo da Igreja lembra que: “Reconhecendo cabalmente esta comunhão de todo o corpo místico de Jesus Cristo, a Igreja terrestre, desde os tempos primevos da religião cristã, venerou com grande piedade a memória dos defuntos”. Essa data tem por objetivo principal relembrar a memória dos mortos, dos entes queridos que já se foram, bem como, para os católicos, rezar pela alma deles, haja vista que, de acordo com a doutrina da Igreja Católica, a alma da maioria dos mortos está no Purgatório, passando por um processo de purificação. Por essa razão, a alma necessita de orações dos para que intercedam a Deus pelo sofrimento que as aflige.
Para o missionário redentorista, Padre Anísio Tavares, celebra-se a vida que é transformada pelo amor misericordioso de Deus. “A celebração leva a compreender o amor de Deus por todos. São filhos e filhas amados, criados segundo a sua imagem e semelhança. Foi por amor e para o amor que Ele deu o dom da vida. Viver bem e em plenitude é o desejo que o Criador tem para todos e cada um de nós.”
Leia MaisDia de Finados: Do que fazer memória?Segundo o missionário, a realidade da morte, no entanto, vem nos fazer olhar além do imediatismo do dia a dia, para ver que o amor de Deus é ainda maior do que se pensa.
“Vida e morte são dois grandes mistérios que ultrapassam nossa compreensão. O nascimento e o falecimento nos levam a fazer as três perguntas: De onde viemos? Onde estamos? Para onde vamos? Pela fé, cremos que a primeira e a última questão têm uma única resposta. Nossa origem e nosso destino é o coração de Deus. Nele, temos a plenitude da vida”, explica.
De acordo com Padre Anísio, saber onde se está faz lembrar que a vida deve ser vivida com intensidade, pois há uma origem e um fim sublimes. “Aprendemos, pois, que a eternidade já começa aqui e agora! Cada um tem um tempo de vida. Não cabe a nós dizer que certa pessoa viveu muito ou viveu pouco. A vida não se mede pela quantidade dos anos, mas pela capacidade de amar, perdoar, doar, etc”.
Ele aponta que se deve rezar pelos irmãos e irmãs que partiram. “Façamos memória agradecida por tudo de bom que eles significaram para nós. Assim, a dor da saudade vai cedendo lugar ao verdadeiro amor, que nos faz ofertar a vida de cada um deles ao Senhor. Que o amor infinito de Deus nos conforte e nos dê força para vivemos na alegria do Evangelho, firmes na esperança da ressurreição”, conclui.
Um pouco de história e cultura
Desde o século I, os cristãos rezavam pelos falecidos. Costumavam visitar os túmulos dos mártires nas catacumbas para rezar pelos que morreram sem martírio. No século IV, já encontramos a Memória dos Mortos na celebração da missa. Desde o século V, a Igreja dedica um dia por ano para rezar por todos os mortos, pelos quais ninguém rezava e dos quais ninguém já se lembrava. Desde o século XI, os Papas Silvestre II (1009), João XVIII (1009) e Leão IX (1015) suscitam a comunidade a dedicar um dia por ano aos mortos. Desde o século XIII, esse dia anual por todos os mortos é comemorado no dia 2 de novembro, porque no dia 1º de novembro é a festa de "Todos os Santos".
Padre Inácio Medeiros orienta que o dia de todos os Santos celebra todos os que morreram em estado de graça, mas não foram canonizados. Já o dia de Finados celebra todos os que morreram não estando em estado de graça total, mais precisamente os que se encontram em estado de purificação de suas faltas e, assim, necessitam de nossas orações.
Contudo, você sabia que o feriado de Finados, celebrado em 2 de novembro, embora originado do cristianismo, foi nomeado de forma diversa à real celebração cristã? Na realidade, o cristianismo, ao contrário do feriado brasileiro, celebra a lembrança dos Fiéis Defuntos e não o dia de Finados. Mas qual a diferença?
Padre Inácio explica que, se adentrando a fundo no significado e na origem das palavras, podemos notar que há sim uma diferença, e relevante. “A palavra 'finado' significa, em sua origem, aquele que se finou, ou seja, que teve seu fim, que se acabou, que foi extinto. A palavra defunto, por sua vez, originada no latim, era o particípio passado do verbo defungor, que significava satisfazer completamente, desempenhar a contento, cumprir inteiramente uma missão. Mais tarde, foi utilizada e difundida pelo cristianismo, para dizer que uma pessoa morta era aquela que já havia cumprido toda a sua missão de viver. Modernamente, porém, tornou-se sinônimo de cadáver.”
Dentre desse contexto, o dia dos Fiéis Defuntos, portanto, é o dia em que a Igreja celebra o cumprimento da missão das pessoas queridas que já faleceram, por meio da elevação de preces a Deus por seu descanso junto a Ele. “É o Dia do Amor, porque amar é sentir que o outro não morrerá nunca, mesmo que esteja distante; amar é saber que o outro necessita de nossos cuidados e de nossas preces, mesmo quando já não o podemos ver. Pois a vida cristã é viver em comunhão íntima com Deus e com os irmãos, agora e para sempre”, opina padre Inácio.
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