Na Igreja existem maneiras diferentes e complementares de seguir Jesus Cristo. Isso se manifesta na espiritualidade, na liturgia e na ação. Na região central da capital paulista o mundo se encontra no trabalho de acolhimento da Missão Paz que pertence à Congregação Scalabriniana, que atua em várias partes do Brasil e do mundo com imigrantes e refugiados.
A Missão Paz busca acolher pessoas de maneira interdisciplinar, respeitando suas histórias e identidades, visando possibilitar integração e protagonismo na nova realidade. Além de oferecer serviços como abrigamento, aprendizagem do idioma, inserção laboral, atendimento médico e jurídico, desenvolve estratégias para promover políticas públicas e o acesso à direitos por meio do diálogo com as diferentes esferas municipal, estadual e nacional.
No contexto eclesial, a Missão Paz lembra que acolher, proteger, promover e integrar os migrantes e refugiados é tarefa da comunidade cristã e não só de um grupo, principalmente durante este período de pandemia. O A12 bateu um papo com Padre Paolo Parise, que ajuda na Missão Paz a acolher todos os irmãos que chegam necessitados de ajuda.
A12 - Como tem sido o trabalho de acolhimento aos irmãos imigrantes durante a pandemia? Quais os maiores desafios e urgências do momento?
Padre Paolo Parise - A pandemia expôs mais uma vez as desigualdades e situações de exclusão social. Durante esta conjuntura, afloraram, entre os grupos mais vulneráveis da sociedade, imigrantes e refugiados: autônomos e microempreendedores que ficaram sem renda, trabalhadores informais sem meios para sobreviver, outros ainda com trabalho formal, mas com salário reduzido, oficinas de costura sem trabalho, exploração laboral na produção de máscaras, imigrantes em situação irregular e, de consequência, sem possibilidade de conseguir a ajuda emergencial do Governo Federal.
Diante da situação de estrema vulnerabilidade, a Missão Paz organizou a distribuição diária de vários itens, como cestas básicas, pacotes de fraldas, embalagens de leite em pó, kits de higiene pessoal, caixas de higiene ambiental, enxovais, cobertores, máscaras. Em alguns casos foi contemplada uma ajuda para aluguel, botijões de gás e transporte. Esta ação foi organizada da seguinte forma: uma assistente social ficou como referência para a triagem, enviando diariamente um lista de 50 pessoas, que na parte da tarde vinham retirar os itens que precisava. Foram beneficiadas mais de 4 mil famílias, de diferentes países, como Angola, Bangladesh, Bolívia, Brasil, Burkina Faso, Colômbia, Cuba, Filipinas, Guiné Bissau, Haiti, Marrocos, Nigéria, Paraguai, Peru, República Democrática do Congo, Síria, Tailândia e Venezuela.
Outras respostas estão sendo dadas. Desde o início da pandemia, a entidade disponibilizou alguns canais para os imigrantes e refugiados que precisam entrar em contato e redirecionando as demandas aos vários profissionais por telefone (11-3340 6950), e-mail (protecao@missaonspaz.org) e facebook.com/missaopazsaopaulo. As assistentes sociais, por exemplo, ajudaram a se cadastrar no aplicativo da Caixa ou no site para obter o auxílio emergencial de R$ 600,00. A psicóloga, advogada e equipe de saúde atendem à distância, desde suas casas, ajudando a solucionar as problemáticas.
Missas e novenas estão sendo transmitidas pelo Facebook e muitos bolivianos estão acompanhando, inclusive rezando por familiares falecidos pelo coronavírus ou que se encontram hospitalizados. O maior desafio neste momento é conseguir cestas básicas para apoiar as famílias em situação de vulnerabilidade. Depois de um momento inicial de muitas doações, agora há uma clara diminuição, prejudicando o atendimento a quem precisa.
A12 - O trabalho se tornou mais fácil ou mais difícil com o passar dos anos? Temos avançado como país em políticas de acolhimento? Qual avaliação o senhor faz?
Padre Paolo - Nestes anos a legislação foi melhorando. Em nível federal, depois da Lei Nº 9.474 de 22 de julho de 1997, que define mecanismos para a implementação do Estatuto dos Refugiados de 1951, e determina outras providências, foi sancionada a Lei Nº 13.445 de 24 de maio de 2017 que institui a Lei de Migração. A Missão Paz, junto com outras instituições, deu uma grande contribuição para a aprovação desta última. Porém, sabemos que a lei não é suficiente. Precisa se concretizar numa política migratória efetiva. Isso não está acontecendo.
Por exemplo, quero sinalizar que desde meados de março deste ano, o governo brasileiro foi publicando inúmeras portarias interministeriais, reafirmando a restrição de entrada em território brasileiro. Estas portarias impedem o acesso ao instituto de refúgio ao dizer que a pessoa que chega em nossas fronteiras está inabilitada para o refúgio. Este conceito jurídico é inexistente no direito migratório. Do outro lado, o Acnur e a OMS editaram documentos muito importantes afirmando que é possível garantir a solicitação de refúgio, sem ameaçar a saúde das comunidades autóctones quanto a disseminação do vírus Covid -19.
Leia MaisSaiba a diferença entre migrante, imigrante e refugiado e as datas dedicadas a elesA12 - A missão seleciona voluntários para o ensino de língua portuguesa. Como fazer para contribuir e ser um voluntário?
Padre Paolo - Antes da pandemia a Missão Paz tinha mais de 80 voluntários atuando em diferentes frentes. Atualmente, por causa do distanciamento social e medidas de prevenção, limitou a ação dos voluntários somente a alguns serviços. Entre eles, há o ensino de língua portuguesa, realizado na modalidade home office. Os interessados podem entrar no Facebook https://www.facebook.com/missaopazsaopaulo e seguir as indicações.
A12 - Qual a importância do trabalho voluntário em serviços de acolhimento como o da Missão Paz. Como enxerga os irmãos que estão dispostos em fazer o bem ao próximo?
Padre - A instituição não conseguiria atender milhares de imigrantes e refugiados ao longo do ano, sem a contribuição dos voluntários. Além do serviço prestado, trazem criatividade, dedicação e um outro olhar que sempre enriquece e abre novas perspectivas.
Os voluntários e voluntárias revelam o que tem de mais lindo no ser humano, a solidariedade e cuidado com o outro. Muitas vezes, pertencem a diferentes tradições religiosas, mas se unem na defesa da vida destas pessoas em situação de mobilidade. No caso dos voluntários católicos, demonstram de ter compreendido o que Jesus contou na parábola do evangelho de Mateus, capítulo 25, quando o próprio mestre de Nazaré se identifica em vários grupos de pessoas, entre elas, “o estrangeiro”.
.:: Assista entrevista exclusiva com Padre Paolo Parise
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