É natural que, numa tragédia como a que está se abatendo sobre o Sul do Brasil nestes últimos dias, as pessoas procurem alento e conforto em meio ao caos e destruição.
Ao lado da solidariedade espontânea que acontece nestas horas, pois o nosso povo tem um grande coração, surgem pessoas que, numa imagem de Nossa Senhora que não se perdeu, ou em algum fato “miraculoso” narrado por alguém, veem como se fossem amostras da presença de Deus.
É importante entender que Deus está sempre se revelando em nossa vida e que devemos estar atentos aos seus sinais. Porém, não podemos confundir certos fatos como se fossem manifestação extraordinária de Deus ou de Nossa Senhora, ou considerar estes fatos como essenciais à nossa fé.
As manifestações de Deus
No vocabulário grego, Teofania (do grego antigo) significa exatamente a manifestação de uma divindade que propicia um encontro pessoal com ela. Esta visibilização da divindade acontece de forma possível de ser observada.
Podemos dizer que numa teofania acontece o aparecimento da divindade no tempo e no espaço e o contato com ela pode ser de forma tangível ou sensível. Teofania é, portanto, uma revelação visível do próprio Deus que se aproxima do ser humano.
Olhando as Sagradas Escrituras, vemos que, no Antigo Testamento, Deus diversas vezes se manifestou visivelmente, assumindo diferentes formas para se revelar às pessoas.
Estas aproximações de Deus tinham a finalidade de tornar sua vontade mais conhecida num determinado contexto da caminhada histórica e da vida do povo escolhido. Elas também possuíam um significado mais amplo e profundo, apontando para o propósito salvífico de Deus e cobrando o cumprimento da aliança assinada com o povo.
A chamada “Esperança Messiânica” que foi sendo incutida na compreensão do povo remetia em última palavra para a presença de Deus em Jesus e para a esperança do fim dos tempos. Esta manifestação foi acontecendo de forma pedagógica na História da Salvação, para que as pessoas pudessem enxergar as promessas divinas concretizadas na missão e na pessoa de Jesus Cristo. Ele é a suprema revelação de Deus!
Hoje, segundo o magistério e a tradição da Igreja, Deus se serve dos meios comuns ou ordinários, sobretudo, através daqueles que são propostos como caminhos de salvação pela Igreja. É preciso saber “ler os sinais dos tempos”. (Mt 24,32)
Presença de Maria na vida do povo
Na história e na caminhada do povo de Deus, a partir do Novo Testamento, Maria assume um lugar significativo e especial, como sinal de esperança, conforto e socorro, sobretudo, nas horas mais difíceis.
A Igreja admite, em condições muito especiais, a manifestação sensível de Nossa Senhora na vida dos cristãos. A estas manifestações dá-se o nome de Mariofania, que significa aparição ou revelação da Virgem Maria.
Este termo faz referência não só às aparições de Nossa Senhora, mas indica, acima de tudo, o real significado de sua pessoa e de sua missão na vida da Igreja, em continuidade com aquilo que narram, sobretudo, os Evangelhos. Estas narrativas é que constituem a verdadeira e fundamental Mariofania.
A Igreja é sempre muito cuidadosa e prudente na aceitação e na explicação das diferentes manifestações de Nossa Senhora, seja na forma de aparições, mensagens ou milagres a Ela atribuídos, sobretudo quando associados a eventos extraordinários.
Os pastores de nossa Igreja são muito criteriosos em confirmar se uma determinada manifestação é realmente de Nossa Senhora, porque, na maioria das vezes, os fenômenos vêm acompanhados de uma forte dose de emoções e de apelos afetivos que podem, inclusive, tender para o sensacionalismo ou fanatismo.
Sempre nestas ocasiões, as pessoas podem se utilizar das redes sociais, por exemplo, para correntes de simpatias movidas pelo apelo emocional. Haja visto que, quando se noticia um possível fenômeno considerado de “ordem sobrenatural”, logo um grande número de pessoas acorre em sua direção, cada uma com uma motivação específica.
A conservação de uma imagem intacta numa capela que ruiu ou em meio à lama de uma inundação deve ser considerada dentro de sua natureza, nunca como um fenômeno extraordinário e, muito menos, como algo fundamental para a fé cristã, para não dar origem a falsas interpretações ou até mesmo a movimentos ligados às pessoas ou a um lugar.
Os fundamentos da fé cristã são o resultado de uma caminhada de quase dois mil anos e nesta caminhada, a Igreja sempre soube diferenciar aquilo que é essencial e permanente daquilo que é transitório.
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