O XI Congresso Brasileiro de Bioética, que comemorou os 20 anos da criação da Sociedade Brasileira de Bioética, realizado em Curitiba (16-18 de setembro de 2015), tratou do tema Bioética e desigualdades. Destro deste contexto temático, numa abordagem inter, multi e transciplinar, numa mesa redonda sobre “Desigualdade e questões éticas de fim de vida”, entre as três apresentações, uma chama atenção: Mistanásia: vulnerabilidade humana frente às desigualdades sociais. Este neologismo provém da etimologia grega mys = infeliz; thanathos = morte; significando morte infeliz, miserável, precoce e evitável em nível social, coletivo.
O relator convidado, um bioeticista holandês que trabalha nos EUA, na sua apresentação, simplesmente fala de vulnerabilidade, mas não utiliza a expressão “mistanásia”, por desconhecê-la.
Assim como Potter, lá no início dos anos 70, cunha o neologismo “bioética”, para que este conceito signifique uma visão ampla de uma ética da vida, que abrangesse para além de todos os seres viventes, também a realidade cósmica ecológica, o que teria de inconveniente em cunharmos um novo neologismo para lidarmos com a realidade da morte que temos que evitar, lutando contra, ou seja, a morte como fruto do descaso frente a vida? Aqui é que entra a novidade do conceito mistanásia.
Mistanásia? Que palavra estranha, o que significa? Certamente esta poderá ser a reação espanto e interrogação de muitos leitores perante este neologismo, que não é tão popular na mídia como o conceito de eutanásia, por exemplo. A reflexão bioética latino-americana, e especialmente a brasileira, ao lidar eticamente com as questões de final de vida, utiliza na reflexão e discussão ética basicamente três conceitos, já consagrados, a saber: eutanásia, distanásia e ortotanásia.
No âmbito da reflexão bioética brasileira, o termo mistanásia foi cunhado por Márcio Fabri dos Anjos, eminente Teólogo da Moral e bioeticista brasileiro, já em 1989, num artigo publicado no Boletim ICAPS (Instituto Camiliano de Pastoral da Saúde), intitulado: "Eutanásia em chave de libertação” (junho de 1989, p.6). Este neologismo provém da etimologia grega mys = infeliz; thanathos = morte; significando morte infeliz, miserável, precoce e evitável em nível social, coletivo. Trata-se da “vida abreviada” de muitos, em nível social, por causa da pobreza, violência, droga, chacinas, falta de infraestrutura e condições mínimas de se ter uma vida digna, entre outras causas.
Leia MaisSondagem indica que maioria dos portugueses é contra eutanásiaEutanásia na HolandaBispos da Bélgica contestam lei que aprova eutanásia infantilAlguns pensadores da ética, até pouco tempo utilizavam a expressão “eutanásia social”, para definir esta realidade. Na verdade, pela etimologia da palavra, de origem grega, temos que eu = bom; thanatos = morte, significando uma “boa morte”, “morte feliz”. Não tem nada de bom ou feliz nesta realidade de “vidas abreviadas” e cortadas tão precocemente, neste contexto tão hostil ao seu desenvolvimento. Muito pelo contrário, estamos diante de terríveis sofrimentos.
O tema que ganha sempre manchete na mídia é eutanásia, que frequentemente é confundida com outros significados, e que, por vezes, alimenta polêmicas e confusões que confundem as pessoas. Assim, urge que façamos alguns esclarecimentos conceituais. Eutanásia hoje é entendida como abreviação de vida. Existe uma situação de dor e sofrimento ditos “intoleráveis", quando ocorre a solicitação da pessoa de tirar a própria vida, e alguém o faz atendendo esta solicitação.
O oposto da eutanásia é a distanásia, ou seja, o prolongamento fútil e inútil do processo do morrer. Estando a pessoa em fase terminal, sem perspectivas de cura do ponto de vista científico médico, continua-se a investir em terapêuticas salvadoras de vida. Na literatura norte-americana, este é denominada de “futilidade médica”. Na Europa, fala-se em “encarniçamento terapêutico”. No Brasil, fala-se de obstinação terapêutica, ou “ações ou terapêuticas inúteis ou obstinadas” (Cf. Código de Ética Médica Brasileiro, 2009). Um médio termo entre estes dois extremos é o que chamamos de ortotanásia, ou seja, a morte certa no lugar e momento certo. Seria a morte natural, sem abreviações de um lado, nem prolongamentos indevidos de outro. É o que a filosofia dos cuidados paliativos procura implementar (...).
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