Nos últimos dias o mundo vem presenciando o desfecho que uma guerra que acontecia há mais de 13 anos contra o presidente da Síria, cuja família governava o país há mais de 50 anos com mão de ferro.
Acredita-se, porém, que a vitória do grupo extremista que dominou o país em poucos dias, obrigando o presidente a fugir do país, não significará o fim dos conflitos porque são muitos os interesses e os grupos envolvidos. Leia MaisJornalista brasileira conta sua experiência com refugiados na SíriaPapa diz que guerra na Síria é mal que precisa cessar
Primavera Árabe e Guerra civil
Antes do início do conflito, a Síria já sofria com o desemprego, corrupção e falta de liberdade política sob o presidente Bashar al-Assad, que sucedeu ao pai, Hafez al-Assad, após a morte deste no ano 2000, estando, portanto, há 24 anos no poder.
Em março de 2011, manifestações pró-democracia começaram no país, inspiradas pelos levantes que aconteciam em países vizinhos contra governos opressivos, movimento que ficou conhecido como “Primavera Árabe”.
A reação levou a população para as ruas exigindo a renúncia do presidente. Conforme a revolta foi se espalhando proporcionalmente a repressão se intensificava. Isso fez com que os grupos envolvidos, apoiados por países estrangeiros, fossem se armando, com o país passando a viver um estado de “Guerra Civil”. Potências estrangeiras começaram a se envolver enviando dinheiro, armamentos ou combatentes. E bem perto da Síria, Israel sempre viu a questão com vigilância e grande preocupação.
O envolvimento de organizações jihadistas extremistas que têm os seus próprios objetivos elevou o conflito a um novo patamar e, a inoperância da ONU incapaz de mediar o conflito, fez crescer a preocupação da comunidade internacional.
A guerra permanente trouxe grande sofrimento, sobretudo, para a população civil, com mortes e desaparecidos. Muitas mortes aconteceram nas abarrotadas prisões administradas pelo governo para onde foram levados os opositores. A ditadura imposta pelo governo levou às continuadas violações dos direitos humanos.
Interesses internacionais
Cada grupo envolvido no conflito tem os seus apoiadores internacionais. O governo contava com o apoio da Rússia e do Irã e foi a campanha militar patrocinada pela Rússia que fez com que a guerra virasse a seu favor a partir de 2015. A Turquia, as potências ocidentais e alguns países do Golfo Pérsico apoiam os vários grupos de oposição.
A Rússia, que mantém bases militares na Síria, fez muitos ataques aos rebeldes visando ajudar o governo, atingindo, porém, tanto os rebeldes como a população civil.
O Irã, outra potência envolvida, mobilizou soldados e gastou muito dinheiro para ajudar Assad. Milicianos xiitas do Grupo Hezbollah do Líbano foram armados, treinados e financiados porque o Irã se interessava em atingir também a Israel.
Do outro lado do conflito se encontram os Estados Unidos, Reino Unido e França que inicialmente ofereceram apoio a grupos rebeldes considerados como “moderados” e ajudaram uma aliança de milícias curdas, árabes, assírias e turcas chamada de Forças Democráticas Sírias, em um território no noroeste do país que antes era dominando pelo Estado Islâmico.
A Turquia, grande apoiadora da oposição, porque faz fronteira com a Síria, tem dado apoio a facções rebeldes para conter, sobretudo, os curdos que é uma minoria envolvida no conflito. A Arábia Saudita, por sua vez, se envolveu porque deseja conter a influência iraniana, armando e financiando os rebeldes no início da guerra.
Enquanto isso, Israel se preocupa especialmente com a presença das forças o Irã na Síria e com o apoio ao grupo Hezbollah que da Síria e do Líbano atacam o país em outra guerra que vem acontecendo.
O sofrimento da população
A guerra de qualquer forma sempre provoca um sofrimento atroz para a população, causando incontável número de mortes, deixando milhões de pessoas feridas, mutiladas ou permanentemente incapacitadas.
Antes da guerra, a Síria tinha uma população de aproximadamente 22 milhões de pessoas. Metade dessa população foi obrigada a deixar suas casas devido aos conflitos, estando desabrigada dentro do país, vivendo em campos temporários.
Por outro lado, milhares de pessoas vivem como refugiadas no exterior, em países vizinhos, provocando um dos maiores êxodos de refugiados da história recente. Uma boa parte dos refugiados professa a fé cristã porque a guerra e ação de grupos de milicianos Jihadistas fundamentalistas trouxe também consigo a perseguição religiosa.
No interior do país, muitos dos que ficaram precisam de alguma forma de assistência humanitária, por causa, sobretudo, da fome que se alastra. A pandemia de Covid-19, complicou ainda mais o quadro que já era caótico.
Os conflitos fizeram com que a infraestrutura vital do país ficasse em ruínas após tantos anos de combates. Estruturas como pontes, estradas e outras instalações foram danificadas ou destruídas e mesmo as instalações médicas, apesar de serem protegidas pela legislação internacional, também foram atingidas pelos ataques com a morte de médicos e profissionais da saúde do país e das organizações de ajuda internacional.
A guerra fez com que grande parte da rica herança cultural da Síria também fosse atingida. Os locais considerados Patrimônios Mundiais da Unesco foram danificados e grupos extremistas destruíram vários sítios históricos.
Para onde vai caminhar o país
Acredita-se que a vitória do grupo extremista Hayat Tahrir al-Sham (HTS), que chefia a coalizão de rebeldes jihadistas que derrubou o ditador Bashar al-Assad na Síria, liderado por Abu Mohammed al-Jolani, um dos insurgentes mais conhecidos do país, e que obrigou a fuga do presidente do país, buscando abrigo na Rússia, não significará o fim da guerra e logo o sofrimento da população, ao menos num curto espaço de tempo
Quem sabe a solução seja a de se montar um governo de transição “formado com base no consentimento mútuo”, como deseja a ONU. No momento não há, entretanto, condições de se saber como será o comportamento das nações externas envolvidas no conflito. Isso será determinante para uma solução pacífica. Sonha-se com a criação de uma nova constituição, levando a eleições livres e justas supervisionadas pela ONU. Mas isso pode ser uma distante utopia.
Outro desejo é que os cristãos e outras minorias étnicas e religiosas sejam respeitados e que aos poucos se criem as condições necessárias para que os milhões de refugiados possam voltar.
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