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Mesmo na guerra vale tudo?

Padre Inácio Medeiros C.Ss.R.

Escrito por Pe. José Inácio de Medeiros, C.Ss.R.

10 NOV 2023 - 11H00

Below the Sky/ Shutterstock

Existe um velho ditado afirmando que “na guerra e no amor vale tudo”. Mas 'pera lá'. Isso é mesmo verdade? Será que na guerra vale tudo mesmo? 

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Não é bem assim. Mesmo no caso de uma guerra, existem regras que precisam ser cumpridas e para fiscalizar o cumprimento de certas prescrições é que existe o Direito Internacional que pode penalizar os envolvidos nos chamados “crimes de guerra” ou nos casos de genocídio.

Trazendo para os nossos dias

O conflito entre Israel e o Grupo Hamas tem levantado discussões ao redor do mundo sobre os limites de uma guerra. A principal questão que se levanta é: o que pode ou não ser feito pelos envolvidos num conflito armado?

Num cenário de guerra, seja ele qual for, os beligerantes devem obedecer a certas regras, previstas pelo Direito Internacional. Isso vale tanto para países como para grupos rivais não estatais. As regras tentam clarear os cenários nos quais o uso da força pode ocorrer, e ao mesmo tempo estabelecer os limites que devem ser observados durante conflitos.

Quando um país se sente atacado, por exemplo, como foi o caso de Israel, ele tem o legítimo direito de resposta, mas segundo as regras do Direito Internacional qualquer ato de autodefesa precisa ser de imediato notificado ao Conselho de Segurança da ONU para que sejam tomadas as medidas necessárias.

O Conselho de Segurança da ONU é o órgão que fiscaliza se o ato de autodefesa extrapolou ou não os limites exigindo restrição, diminuição ou encerramento total do uso da força.

O desafio maior, no entanto, é que a ONU tem se tornado cada vez mais um órgão meramente fictício e sua autoridade não é acatada, mesmo a do Conselho de Segurança. Por outro lado, é muito complicado justificar quando uma é guerra justa ou não, mesmo em casos de autodefesa, porque está mais do que provado que a guerra nunca foi solução.

Por esta razão é que o Papa Francisco, em nome dos cristãos pede o fim imediato dos conflitos e a negociação pela paz.

Regras internacionais

Uma das maiores preocupações é sempre a proteção da população e dos bens civis como questão humanitária. Por isso, o Direito Internacional trabalha para limitar ao máximo os efeitos dos conflitos armados para que a população civil seja afetada o menos possível.

O direito mostra que todos os que lutam numa guerra devem respeitar o conjunto de regras, seja as forças de Estados Beligerantes como os grupos não estatais, como é o caso dos grupos que atuam no conflito entre Israel e Palestinos.

Neste caso, o perigo maior é que o conflito se expanda, ultrapassando as fronteiras dos atuais beligerantes com o envolvimento de outros países.

As regras que protegem os civis são também aplicadas em relação aos prisioneiros de guerra e combatentes feridos, para que se chegue a um equilíbrio entre as preocupações humanitárias e as exigências militares do conflito.

O Direito Internacional também aplica restrições quanto ao uso de determinados tipos de armas ou métodos de guerra, proibindo, por exemplo, o assassinato e a tortura das pessoas, prevendo a proteção e o respeito das atividades médicas e de seus profissionais, bem como a facilitação do trabalho das equipes humanitárias.

Princípios humanitários

Após as duas grandes guerras mundiais o Direito Internacional avançou muito na formulação de seus princípios que nem sempre são obedecidos pelos beligerantes. Em todo caso, algumas regras foram se consolidando como aquela que prevê a distinção entre a população e os bens civis como escolas e hospitais em relação aos combatentes e objetivos militares.

A regra prescreve que os ataques só podem ser direcionados contra alvos militares e os ataques contra civis ou indiscriminados, como aqueles que atingem tanto militares como civis são proibidos. Numa guerra é possível atacar objetivos militares, mas não se pode exercer o uso da força de modo que não se permita distinguir entre civis e combatentes.

Ao atacar um objetivo militar, a perda acidental de vidas civis, lesões a civis, danos a bens civis, ou sua combinação não deve ser excessiva em relação à vantagem militar concreta e direta prevista. As partes envolvidas precisam prever danos que possam ser causados diretamente por um ataque e os efeitos indiretos.

As partes envolvidas num conflito armado devem ter o constante cuidado de poupar a população civil e os bens civis durante a condução das operações militares, tomando todas as preocupações colaterais que pode incluir a evacuação temporária de civis, ou pelo menos permitir a sua saída, de uma área sitiada onde as hostilidades estão ocorrendo, favorecendo a criação de “corredores humanitários” por onde a ajuda médica e humanitária como fornecimento de água, alimentos e medicamentos possa ocorrer, bem como a saída de pessoas não envolvidas no conflito.

É por isso que, comboios humanitários e meios de transporte que transportem civis não podem ser atacados.

Tribunal Penal Internacional

As normas do Direito Internacional Humanitário foram previstas na Convenção de Genebra de 1949, nos seus protocolos adicionais e nos tratados internacionais que proíbem o uso de determinados meios e métodos de guerra e protegem algumas categorias de pessoas e objetos contra os efeitos das hostilidades.

Se as regras relativas à guerra forem desrespeitadas, há consequências previstas, sendo o Tribunal Penal Internacional responsável por julgar os crimes mais graves de interesse internacional, incluindo crimes de guerra. Esse tribunal não julga Estados, e sim indivíduos.

A jurisdição do Tribunal entra em ação quando um Estado não se mostrar capaz ou estiver relutante em processar indivíduos suspeitos de terem cometido crimes de guerra sobre os quais tem jurisdição, como foi o caso de crimes cometidos na guerra na antiga Iugoslávia, no Kosovo e em outros países.

Criado em 1998, pelo Tratado de Roma, o Tribunal Internacional entrou em vigor em 2002, passando a ter competência universal para julgar pessoas por crime de guerra, crimes contra a humanidade, crimes de genocídio e crime de agressão desde o ano de 2002.

Claro que antes da constituição deste tribunal outros tribunais internacionais agiram em determinas ocasiões, mas exceção como aconteceu com o de Nuremberg, com o tribunal de Tóquio e dois tribunais criados pelo conselho de segurança da ONU na década de 1990 que foram tribunais específicos para situações específicas.

Escrito por
Padre Inácio Medeiros C.Ss.R.
Pe. José Inácio de Medeiros, C.Ss.R.

Missionário redentorista graduado em História da Igreja pela Universidade Gregoriana de Roma, já trabalha nessa área há muitos anos, tendo lecionado em diversos institutos. Atuou na área de comunicação, sendo responsável pela comunicação institucional e missionária da antiga Província Redentorista de São Paulo, tendo sido também diretor da Rádio Aparecida.

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Por Redação A12, em Mundo

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