Há dias tem circulado na internet e nos noticiários imagens da situação dos povos da maior reserva indígena do Brasil, o Território Yanomami. A população deste território vive uma crise humanitária, sanitária e de segurança alimentar.
De acordo com o Ministério dos Povos Indígenas, estima-se a morte de pelo menos 570 crianças por fome, desnutrição e contaminação por mercúrio em 2022.
A falta de fiscalização dos governos diante dos avanços do garimpo na região, fez com que o número de garimpeiros passasse de 20 mil, no último ano. Quase o tamanho da população dos povos originários, que soma 28 mil.Leia MaisCNBB divulga nota de solidariedade ao povo Yanomami
A Igreja Católica e os bispos demonstram insatisfação diante da situação do Povo Yanomami e no último dia 21 de janeiro, bispos da Regional Norte 1 da CNBB, divulgaram uma nota de indignação e solidariedade.
“Estamos diante de mais uma situação em que se repete o que foi denunciado pelo Papa Francisco na Querida Amazônia: ‘os povos nativos viram muitas vezes, impotentes, a destruição do ambiente natural que lhes permitia alimentar-se, curar-se, sobreviver e conservar um estilo de vida e uma cultura que lhes dava identidade e sentido’”.
Dom Roque Paloschi, presidente do Conselho Missionário Indigenista (Cimi), em entrevista ao Portal A12, falou sobre o avanço dos garimpeiros no território, responsáveis por grande parte dos problemas que contribuem para a crise enfrentada nas aldeias.
“Evidentemente que nos últimos quatro anos, desde 2019, os invasores se sentiam autorizados, se sentiam amparados pelos discursos do próprio presidente e de sua equipe de governo, sem contar o então ministro da Justiça que remeteu de volta 9 processos já feitos, para o reconhecimento de terras indígenas e o remetendo de volta, fazendo voltar tudo a estaca zero, e consequentemente passou os 4 anos do governo sem nenhum reconhecimento de terras indígenas”.
O bispo também falou que o Brasil é um país preconceituoso e discriminatório, onde tentamos negar os direitos dos povos originários e lembra que todos nós temos o dever de proteger os direitos desses povos. E devemos amadurecer nosso pensamento.
“Agora nós temos um longo caminho a percorrer, porque a mentalidade de muitos de nós é achar que os povos indígenas são contra o progresso, são contra desenvolvimento. Errado!
Os povos indígenas não são contra o progresso, não são contra desenvolvimento.
Agora eles nos perguntam e nós precisamos responder: Que desenvolvimento é esse que destrói a natureza, envenena as águas, a terra e o ar, para concentrar riqueza nas mãos de poucos?
Por isso, mais do que nunca, nós temos que entender que eles não são obrigados a entrar na nossa dinâmica, do produzir, do consumir. Temos que respeitar o modo de vida deles.
Então isto exige de nós também a responsabilidade maior”.
Dom Roque falou sobre a importância das atividades da Igreja Católica e dos missionários que realizam missões nas aldeias indígenas, além de levar as Palavras do Evangelho, sem fazer com que o povos originários percam a essência de sua cultura. E finalizou com um apelo a toda população para que não sejamos indiferentes.
“Que o meu coração, o teu coração não seja indiferente diante da dor dos pobres, diante da dor dos povos mais fragilizadas desse país. Desses povos que são agredidos na medida em que nós aumentamos o preconceito, a discriminação e a indiferença diante deles. Que o meu coração e que o teu coração não seja indiferente”.
E completou:
“Ali está Jesus crucificado no meio do povo Yanomami. ‘Eu estava com fome e tu não me deste de comer, estava com sede e não me deste de beber’. E quando nós deixamos de fazer a um dos pequeninos, assim nós negamos o direito de Jesus. Por isso o apelo para que o teu coração, que o meu coração, não seja indiferente diante da dor dos povos originários, do povo Yanomami”.
A Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), também emitiu uma nota em defesa dos povos originários. Confira na íntegra:
Em defesa dos povos originários
A ofensiva contra os direitos dos povos indígenas, agravada nos últimos anos, foi denunciada pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI), em seu relatório anual. A realidade vivida pelo povo Yanomami é, pois, síntese do que apresenta o relatório do CIMI. Os povos originários, integrados à natureza, têm sido desrespeitados de modo contumaz, a partir da ganância, da exploração predatória do meio ambiente, que propaga a morte em nome do dinheiro.
Essa realidade deve despertar santa indignação no coração de cada pessoa, especialmente dos cristãos, que não podem fazer da defesa da vida uma simples bandeira a ser erguida sob motivação ideológica. A vida tem que ser efetivamente defendida, não apenas em uma etapa específica, mas em todo o seu curso. E a defesa da vida humana é indissociável do cuidado com o meio ambiente.
A CNBB pede às autoridades um adequado tratamento dedicado ao povo Yanomami e a cada comunidade indígena presente no território brasileiro. Diante da gravidade do que se verifica no Norte do País, das mortes, principalmente de crianças e de idosos, sejam apontados os responsáveis, para que a justiça prevaleça. O genocídio dos Yanomamis seja capítulo nunca esquecido na história do Brasil, para que não se repita crime semelhante contra a vida de nossos irmãos.
A Igreja Católica no Brasil está unida ao povo Yanomami, solidariamente, com sua rede de comunidades de fé. As dores de cada indígena são também da Igreja, que, a partir de sua doutrina, do magistério do Papa Francisco, vem ensinando a importância dos povos originários na preservação do planeta.
O momento é de tristeza e desolação, mas a Igreja Católica continuará a trabalhar, intensificando sempre mais as suas ações, em união com muitos segmentos da sociedade e do poder público, para que prevaleça a esperança, confiante de que cada Yanomami será respeitado em sua dignidade de filho e filha de Deus.
Brasília-DF, 31 de janeiro de 2023
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