Disseram-me que era para falar sobre uma Igreja natalina (ou lava-pés?) encarnada e de comunidade. Bom, até podia ser um tratado de Eclesiologia, aliás, bom assunto para uma conclusão de curso.
Mas espero que Deus não fique bravo comigo, pois não compreendi por que seu Filho nasceu em um canto do mundo, em um estábulo, na periferia da vida, experimentou a rejeição e o não acolhimento? Acho que já foi demais.
Deus podia ter preparado um palácio primeiro, os homens terem colocado mãos à obra e deixado tudo muito arrumado, com os melhores móveis e o maior conforto. Mas não vi nada disso.
Como pode Deus permitir que seu Filho nascesse tão abandonado e em um lugar até esquisito? Se tivesse sido mais fantástico, acho que seria mais fácil para os homens entenderem, porque haveria holofotes, televisão, rádio, jornal, todos à espreita do acontecimento.
E, além de tudo isso, Ele nasceu à noite.
Depois apareceram por lá alguns homens rudes que chamavam de pastores; uns pobres coitados, que só tinham estrada para andar e ovelhas para cuidar.
Desculpe-me, Deus, mas acho que o Senhor não fez as coisas direito não.
O mundo, que adora o fantástico, o exuberante, o impressionante, o que dá sucesso maior com o menor esforço possível, não é mesmo capaz de penetrar o mistério de amor escondido no presépio, mistério de alguém que nasce no meio da noite e se encarna na realidade humana. Foi à noite, para nos indicar que Ele é a luz que dissipa qualquer treva.
Leia MaisQuando o humano e o divino se encontram!O mistério do Natal em Santo Afonso de LigórioAinda mais mistério: ele é Deus e veio morar no meio dos homens. Quem é orgulhoso e soberbo de si não sabe da sinfonia que explodiu em todo o universo, ouvida pelos pobres Pastores e cantada pelos Anjos: “Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos que compreendem esse mistério de amor”.Imagine comigo: “Quem sou eu, para ser amado por Deus, a ponto de ele me dar o que lhe é mais precioso, mais nobre, único, como seu Filho?”.
Um dia a humanidade irá concluir que existe Natal sem panetone e sem presente: o natal dos pobres!
“Eu te bendigo, Pai, porque escondeste estas coisas dos sábios deste mundo”. É verdade! Ele veio do modo certo: no silêncio, na periferia, na noite! Ele veio de um jeito que os pobres compreendem, porque se fez um deles! “Quer me seguir? Mas eu não tenho nem mesmo uma pedra para reclinar minha cabeça”. É assim o Deus de Jesus. É assim nosso Redentor.
A Igreja assim o anuncia e do jeito de Jesus ela deve ser: aproximar-se dos pobres!
Olhando para o presépio, não dá para entender aqueles que querem só a beleza exterior da Igreja. O que é belo se faz pérola escondida e temos de descobri-lo. Na noite do silêncio está lá aquela que em silêncio contempla, junto com os Pastores, junto com os pobres, o Redentor meu e seu: a Virgem santa e bela, a catedral mais bela e iluminada do mundo, Maria, a Mãe do Salvador.
Desculpe-me, Deus, minha impetuosidade. Acho que agora estou começando a entender um pouquinho de seu imenso amor! Que os enfeites, as luzes e as festas não atrapalhem seu sonho, seu projeto de amor, que me toca, envolve-me, fascina-me. Obrigado por seu presente: Jesus! Obrigado por sua encarnação. Obrigado por minha Comunidade, em que posso viver, celebrar e beber sem cessar da verdade, que me salva e me conduz. Não quero cantar sozinho, pois com você vai melhor. Feliz Natal, mas igual ao de Jesus!
Pe. Ferdinando Mancílio, C.Ss.R.
Diretor de periódicos da Editora Santuário
Fonte: Artigo postado originalmente no Informativo da Província.
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