"Eu sou a ressurreição e a vida... quem vive e crê em mim, não morrerá jamais".
Mas, que novidade nos teria doado a nós humanos que, por natureza, já a possuíamos?
No episódio comumente conhecido como “ressurreição de Lázaro” que João registra no capítulo 11 de seu Evangelho, a certa altura Jesus, consolando Marta, lhe garante:
“Teu irmão ressuscitará”. A que ela reage: “Sei que ele ressuscitará na ressurreição, no último dia”, passando-nos a impressão de um “último dia” ainda muitíssimo distante. E atentemos à maravilhosa e estupenda correção que Jesus faz: “Eu sou a ressurreição e a vida... quem vive e crê em mim, não morrerá jamais”.
Jesus arrasta aquele “último dia” para bem junto de Si, para o Seu e nosso hoje. Não diz “Eu serei”, mas “Eu sou a ressurreição... quem vive e crê”: quem vive porque crê!
Ainda nesse mesmo episódio, para nos revelar e garantir a divina, eterna qualidade de vida que nos veio trazer, e que acolhemos por nossa fé n’Ele, Jesus vai definir como sendo sono de Lázaro o que os discípulos entendiam como morte física: “nosso amigo Lázaro está dormindo e vou lá acordá-lo”.
E diz isso de quem jazia há 4 dias no túmulo. Quem se faz Seu amigo, crente, discípulo, seguidor – crendo n’Ele – de fato não só não morre, mas passa já a viver a vida d’Ele, a eterna ou divina! Morte é romper com Ele, rejeitá-Lo como a paterna proposta de caminho, de verdade, de vida para nós. Sim, “quem tem o Filho, tem a vida; quem não tem o Filho, não tem a vida” (1Jo 5,12).
É assim Sua própria vida trinitária, divina, eterna (para a Trindade, sem começo nem fim; para nós: com começo e igualmente sem fim) que Jesus nos vem trazer em nome e como projeto do Pai, na força do Espírito Santo. Sim, “se é só para esta vida que pusemos a nossa esperança em Cristo, somos, dentre todos os homens, os mais dignos de compaixão” (1Co 15,19)!
Penso que tudo isso é conteúdo tranquilo do depósito da fé de todos nós. Mas, o que desejo frisar é o começo de nossa fruição desse divino dom, que é a vida eterna, a vida do próprio Deus. Em princípio, Jesus nos podia comunicar apenas Sua vida humana, a vida que Ele-criador não tendo, assumiu-a de Maria de Nazaré por ação do Espírito Santo.
Mas nos assumiu a condição mortal, humana para que nessa união profunda conosco nos comunicasse aquilo de que jamais abriu mão, que é Sua vida divina, eterna. É essa a vida que nos comunica já aqui e agora, é aqui e agora que Ele nos inaugura o reino dos céus, de Deus. Não é essa Sua eterna vida que Ele nos comunica na Eucaristia? Se radical e já etimologicamente batismo quer dizer mergulho (e o entendamos igualmente como enxerto, inserção), não é no próprio ministrarem-nos esse Sacramento que somos mergulhados, enxertados nas Três Pessoas Trinitárias, e inseridos n’Elas-Tronco como ramos que passam a viver d’Elas, de Sua vida?
Diante disso então, por que temer ou adiar tanto a vida eterna? A Eucaristia é a maior força divinizadora, cristificadora que temos à disposição aqui e agora. Para Ruperto, Jesus diria a seus comungantes: “Vós sereis por graça o que sou por natureza!”
Às vezes, a meu ver, tenho que ouvir aquele medo ou adiamento neste adendo ou algo afim que se faz ao texto litúrgico:
“Deus todo-poderoso tenha compaixão de nós, perdoe nossos pecados e um dia nos conduza à vida eterna!".
Que “um dia” é esse? É aquele “último” pensado e certamente esperado e sonhado por Marta, e que Jesus corrigiu, arrastando-o para o hoje? Quando nos chegaria esse dia? Jesus, conforme João (7,37-39), interpreta “o último dia”, “o mais solene da festa” como sendo Sua hora, Sua cruz quando morrendo-ressuscitando nos entrega o Espírito, o Seu dinamismo divino que Lhe deu inaugurar o reino ou vida divina já aqui nas paralelas da História, “passando a vida a fazer o bem” (At 10,37s). E nesse mesmo Espírito, vem-nos a própria vida de Deus, Sua divina vida, o amor: “o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado” (Rm 5,5).
Quem sabe nem sequer ainda vislumbramos a estupenda divina grandeza que já nos foi e nos está sendo dado viver aqui e agora, a vida divino-eterna. Sim: aqui e agora já ela; e em plenitude também sim: um dia!
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