Alicerçado em boa fundamentação teológica, nosso Fundador Afonso de Ligório escolheu o nome de Santíssimo Salvador para nosso Instituto. Todavia, por razões outras, a Igreja nos aprovou, timbrando-nos como Congregação do Santíssimo Redentor. Também aí nos resta curvarmo-nos à Providência cuidadosa de Deus.
Pelo carisma fundacional de Santo Afonso, que nasce da necessidade que ele experimenta, de responder à premente situação de abandono pastoral, que o coage a fundar uma nova congregação, vemos que o melhor nome que nos cabe é o que a Igreja nos deu.
:: CSSR - O que essa sigla representa?
Afonso sente-se chamado e fortemente interpelado, qual um goel do século XVIII, por seu sangue mais pisado e dorido, que eram os cabreiros de Scala.
Em seu constante e crescente êxodo, rumo aos sempre mais abandonados, que ele vai descobrindo e por quem vai se compadecendo, por aqueles de Scala sentia bater mais forte seu coração consanguíneo: para ele, era seu sangue mais marginalizado espiritualmente, a que se somava também o abandono sócio-político-econômico.
:: Scala - experiência fundante de Santo Afonso
Assim, nossas Constituições tentam reinterpretar e atualizar aquela experiência de goel de Afonso para nós hoje: “A preferência pelas condições de necessidade pastoral ou pela evangelização propriamente dita e a opção em favor dos pobres constituem a própria razão de ser da Congregação na Igreja e o distintivo de sua fidelidade à vocação recebida” (C.5 1º §).
Devemos ser a compaixão entranhada (rehem) do Redentor (goel) a cuidar, com particular carinho, desses nossos membros mais doloridos! Que nos sintamos movidos principalmente pelas necessidades desse outro (rhm), nosso sangue!
Paulo nos dizia acima que ninguém despreza a própria carne, mas dela cuida com todo cuidado. Nesse espírito, nossa legislação nos garante que jamais viveremos devidamente nossa missão tão somente através de um ministério, de atividades pastorais. Não, toda ação apostólica nossa deve ser irrenunciavelmente um gesto de caridade, de amor para com nossos destinatários, pois só com amor é que se cuida de si mesmo, do próprio sangue: “O testemunho de vida e de caridade conduz ao testemunho da palavra (cf. Rm 10,17).
Leia MaisRedenção: amor e misericórdia de DeusA Cruz é chave da Redenção do mundoQuando chegar a hora e o Senhor lhes abrir a porta da palavra (cf. Cl 4,3), os Redentoristas, completando o testemunho da presença fraterna com o testemunho da Palavra, anunciam confiantes e constantes o Mistério de Cristo (cf. At 4,13.29.31)” (C.10).
Somos vivamente motivados a viver uma união visceral com nossos destinatários. É marcante a insistência em que vivamos a “caridade pastoral” (C.16.18.21.44.54), a “caridade apostólica” (C.52) ou “missionária” (C.65) ou “apostólica e missionária” (C.53). Sem misericórdia ou compaixão – atitude definidora do goel – não atua devidamente nosso carisma redentorista!
“Chamados a continuar a presença de Cristo e sua missão de redenção no mundo, escolhem os Redentoristas a pessoa de Cristo como centro de sua vida. Esforçam-se por se unir sempre mais a Ele em comunhão pessoal... Na medida em que os confrades mais intimamente se unirem a Cristo, mais estreita será a comunhão entre eles próprios” (C.23).
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Sem a presença de Jesus, não temos como continuar fielmente Sua missão de redenção. E presença d’Ele parece sugerir ou mesmo requerer seu coração pulsando em nós ou em nosso coração.E assim, atuaríamos Sua compaixão e misericórdia: Seu especial sentir o outro como sendo Si mesmo, Seu próprio sangue! E de nossa união com Ele, geramos a comunhão entre nós, construindo o ideal que é sermos uma Comunidade apostólica de compassivos, de misericordiosos, de goalim!
O exílio babilônico foi o canteiro onde floresceu com força a teologia da redenção. O Dêutero-Isaías (Is 40-55) é o primeiro dos profetas a aplicar a Javé o título de goel de Seu povo. Esse fato soa-me como muito gritante e apelativo para nós redentoristas, os goalim de hoje. No mais humilhante revés histórico, o Profeta faz transbordar, sobre o povo desanimado, mais que palavras, a sua fé inabalável e confiante em seu Deus. Num Deus que o desânimo levava a crer, abandonara Seu povo. Mas não, era o goel, o Deus parente, consanguíneo, próximo que sofria no povo exilado uma terrível dor em Si mesmo.
Enviados aos mais abandonados, devemos nos carregar de tal modo dessa mesma fé que, sobretudo por testemunho, por “caridade apostólica”, por comoção visceral, impregnemos nossos destinatários dessa mesma fé, vivida numa esperança invencível que se lança decidida a conquistar dias melhores, “novos céus e nova terra”. É o jeito inspirado de vivermos o profetismo nos dias atuais. Profetismo que jamais se resigne, jamais aceite, por piores que sejam as circunstâncias, a morte da fé, da eleição, da missão!
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E para concluir, acolhamos os cinquentenários ecos do Vaticano II, tão atuais e igualmente provocadores até hoje: “Os... institutos façam o possível... por darem um testemunho como que coletivo de pobreza, e contribuam de boa vontade com algo de seus próprios bens para... o sustento dos pobres, a quem os religiosos todos hão de amar nas entranhas de Cristo (cf. Mt 19,21; 25,34-46; Tg 2,15-16; 1Jo 3,17)” (PC 13/1257).
Esse texto da Perfectae Caritatis não nos soa como uma radiografia de nós redentoristas, do coração entranhado que devemos adquirir e cultivar em favor de nossos abandonados? Tenhamos todo outro como carne de nossa carne, osso de nossos ossos e – mais familiarmente falando – sangue de nosso sangue, pois sem goelança / rhm / splagchna / compaixão,não continuamos o Redentor e Sua missão!
Bibliografia
Brehl, M. CSsR, “Reflexões bíblicas sobre o Redentor” in URB e SECRETARIADO GERAL PARA A ESPIRITUALIDADE (org.), v.10 Espiritualidade Redentorista – Ensaios sobre a Redenção, Editora Santuário Aparecida, SP 2007 p.67-88
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